28.04.2023

Áreas de Prática: Trabalho

Agenda do Trabalho Digno: desafios para as organizações

A Lei n.º 13/2023, de 03 de abril, veio proceder à 23.º alteração ao Código do Trabalho (aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro), bem como a variadíssima legislação conexa, no âmbito da denominada Agenda do Trabalho Digno.

A maioria das alterações ora introduzidas, que entram em vigor a 01 de maio de 2023, apresentam-se como verdadeiros desafios para as organizações e gestão dos seus recursos humanos.

Neste âmbito, a Abreu Advogados pretende responder sucintamente às principais questões acerca das recentes alterações, sem prejuízo de muitas outras que, seguramente, se colocarão a seu respeito.

 

1. Parentalidade

O que muda na licença parental inicial?

Após o gozo de 120 dias de licença parental, os pais podem acumular os dias remanescentes da licença com trabalho a tempo parcial, prolongando deste modo o período global da licença.

 

O que muda na licença parental exclusiva do pai?

A licença parental obrigatória do pai é aumentada dos atuais 20 dias úteis para 28 dias seguidos, devendo ser gozada de modo consecutivo ou por períodos mínimos de 7 dias, nos 42 dias seguintes ao nascimento. Pelo menos 7 desses dias devem ser gozados consecutiva e imediatamente após o nascimento. Após a licença, o pai tem direito a gozar 7 dias, ao invés dos anteriores 5 dias, consecutivos ou interpolados, em simultâneo com o gozo da licença parental inicial da mãe.

 

O que muda na licença parental exclusiva da mãe?

Passa de 6 semanas para 42 dias o gozo obrigatório, por parte da mãe, de dias consecutivos de licença a seguir ao parto.

 

O que muda relativamente aos processos de adoção?

Os trabalhadores candidatos a adotantes e a famílias de acolhimento passam a não ter qualquer limitação ao número de dias de dispensa para cumprimento das obrigações previstas nos respetivos processos.

 

1.1 Trabalhador cuidador

Quem é Trabalhador Cuidador?

Apenas se aplica ao cuidador informal não principal:

· o cônjuge ou unido de facto,

· parente ou afim até ao 4.º grau da linha reta (filhos, netos, bisnetos, bisavós, trisavós e trinetos)

· ou da linha colateral da pessoa cuidada (irmãos, tios, tios-avós e primos)

que acompanha e cuida de forma regular, mas não permanente, podendo auferir ou não remuneração de atividade profissional ou pelos cuidados que presta à pessoa cuidada.

 

Qual a licença do Trabalhador Cuidador?

O trabalhador cuidador tem direito, para assistência à pessoa cuidada, a uma licença anual de cinco dias úteis (devem ler-se dias de trabalho), que devem ser gozados de modo consecutivo. Não determina a perda de quaisquer direitos, salvo quanto à retribuição, e é considerada como prestação efetiva de trabalho.

O Trabalhador Cuidador tem direito a formas de flexibilidade laboral?

• O trabalhador cuidador tem direito a trabalhar a tempo parcial, de modo consecutivo ou interpolado, pelo período máximo de quatro anos.

• O trabalhador cuidador tem direito a trabalhar em regime de horário de trabalho flexível, de forma seguida ou interpolada, enquanto se verificar a necessidade de assistência.

• O trabalhador cuidador não é obrigado a prestar trabalho suplementar enquanto se verificar a necessidade de assistência.

O Trabalhador Cuidador tem alguma proteção em caso de despedimento?

• O despedimento de trabalhador cuidador carece de parecer prévio da entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres (Comissão para a Igualdade no Trabalho e Emprego – CITE).

• Também em caso de denúncia durante o período experimental ou de não renovação de contrato a termo, o empregador deve comunicar à CITE.

 

2. Dever de Informação

Quais os deveres adicionais de informação a cargo do empregador?

Relativamente à informação que deve ser prestada ao trabalhador, o empregador fica agora obrigado a um dever acrescido ou mais vasto de informação. A título de exemplo, o empregador passa a ter de indicar a duração previsível do contrato quando esteja em causa um contrato a termo incerto; a determinar os requisitos formais a serem observados para a cessação do contrato de trabalho; a informar sobre o regime aplicável em caso de trabalho suplementar e de organização por turnos; a duração e condições do período experimental; os regimes de proteção social.

 

Quais os deveres adicionais de informação a cargo do empregador?

Parte da informação deve ser disponibilizada até ao sétimo dia subsequente ao início da execução do contrato de trabalho e outra parte no prazo de um mês após esse início.

 

2.1 Período Experimental

Qual a consequência da não previsão do período experimental no contrato de trabalho?

Passa a presumir-se que as partes acordaram na exclusão do período experimental, quando o empregador não informe o trabalhador da duração e condições do período experimental.

Qual o período experimental dos trabalhadores à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração?

Pode ser de até 180 dias, reduzindo-se ou excluindo-se consoante a duração de anterior contrato de trabalho a termo de duração igual ou superior a 90 dias, ainda que celebrado com empregador diferente.

 

Como se opera a denúncia durante o período experimental?

A lei vem aumentar o período de aviso prévio de 15 para 30 dias quando o empregador pretenda denunciar o contrato de trabalho durante o período experimental que tenha durado mais de 120 dias.

 

2.2 Contrato a termo resolutivo

Qual o novo dever de informação nos contratos a termo?

Do contrato de trabalho a termo deve constar a indicação do termo ou da duração previsível do contrato conforme o termo seja certo ou incerto, respetivamente, sob pena do empregador incorrer em contraordenação leve.

 

O que muda na sucessão de contratos a termo?

Vem alargar-se a proibição de nova admissão ou afetação de trabalhador através de contrato de trabalho a termo antes de decorrido 1/3 da duração do contrato cuja execução se concretize na mesma atividade profissional, ainda que celebrado com sociedade que mantenha estruturas organizativas comuns com o empregador.

 

2.3 Trabalho temporário

Qual a consequência da celebração de um contrato de utilização de trabalho temporário com uma empresa de trabalho temporário não titular de licença para o exercício da respetiva atividade?

O trabalhador temporário considerar-se-á vinculado ao utilizador mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado.

O que muda no conceito de contratos de utilização de trabalho temporário sucessivos? E quais as consequências?

Passam a ser considerados contratos de utilização de trabalho temporário sucessivos e, em consequência, proibidos, não apenas os celebrados para o mesmo posto de trabalho, mas também os celebrados para a mesma atividade profissional.

No mais, são considerados como sucessivos os contratos celebrados com sociedade que se encontre em relação de domínio ou de grupo com o empregador, ou que com ele mantenham estruturas organizativas comuns.

A consequência da violação desta proibição é que o trabalhador temporário considerar-se-á vinculado ao utilizador mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado, com antiguidade reportada ao primeiro contrato.

 

Qual a duração máxima dos contratos de trabalho temporários sucessivos em diferentes utilizadores?

Na situação de contratos de trabalho sucessivos em diferentes utilizadores, celebrados com o mesmo empregador (ou com sociedade que se encontre em relação de domínio ou de grupo com o empregador, ou que com ele mantenha estruturas organizativas comuns), a duração máxima é de 4 anos. Ultrapassada a duração máxima o contrato de trabalho converte-se em contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária.

O contrato de trabalho temporário passa a ser renovável apenas até 4 vezes, em lugar das anteriores 6 vezes.

 

2.4 Teletrabalho

A quem se alarga o direito ao regime de teletrabalho?

Passam a ter direito ao teletrabalho os trabalhadores com filhos que, independentemente da idade, tenham deficiência, doença crónica ou doença oncológica, que vivam com o trabalhador em comunhão de mesa e habitação.

 

Como deve ser definida a compensação pelas despesas adicionais?

A definição de um valor fixo para a compensação pelas despesas adicionais passa a ser definida por contrato de trabalho e/ ou por contrato coletivo de trabalho.

 

E se não for possível estabelecer um acordo?

Não sendo possível a definição por acordo, serão consideradas despesas adicionais as correspondentes à aquisição de bens e/ ou serviços de que o trabalhador não dispunha antes da celebração do acordo de teletrabalho, assim como as determinadas por comparação com as despesas homólogas do trabalhador no último mês de trabalho em regime presencial.

 

A compensação definida é tributável?

Aguarda-se Portaria do Governo quanto a esta matéria. Em geral, não serão objeto de tributação os montantes que tenham uma correspondência real com as despesas adicionais suportadas pelo trabalhador.

 

2.5 Trabalho suplementar

Qual o novo esquema remuneratório do Trabalho Suplementar?

O trabalho suplementar até às 100 horas anuais é pago pelo valor da retribuição horária com os seguintes acréscimos:

• 25 /prct. pela primeira hora ou fração desta, e 37,5 /prct. por hora ou fração subsequente, em dia útil;

• 50 /prct. por cada hora ou fração, em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, ou em feriado.

O trabalho suplementar superior às 100 horas anuais é pago pelo valor da retribuição horária com os seguintes acréscimos:

• 50 /prct. pela primeira hora ou fração desta, e 75 /prct. por hora ou fração subsequente, em dia útil;

• 100 /prct. por cada hora ou fração, em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, ou em feriado.

 

2.6 Faltas

Qual o limite de faltas justificadas em caso de falecimento de cônjuge, parente ou afim?

O trabalhador pode faltar justificadamente:

a) Até 20 dias consecutivos, por falecimento de cônjuge, filho ou enteado;

b) Até 5 dias consecutivos, por falecimento de parente ou afim no 1.º grau na linha reta (pais e sogros);

c) Até 2 dias consecutivos, por falecimento de outro parente ou afim na linha reta (avós e netos), ou no 2.º grau da linha colateral (irmãos).

 

O que muda nas faltas justificadas por motivo de doença do trabalhador?

Até duas vezes por ano (até três dias consecutivos cada), o trabalhador pode fazer prova da situação de doença enquanto motivo de falta justificada através de declaração do serviço digital do Serviço Nacional de Saúde ou dos Serviços Regionais de Saúde das Regiões Autónomas, emitida com base em auto-declaração do trabalhador, sob compromisso de honra.

 

Em caso de luto gestacional posso faltar?

É prevista uma nova modalidade de falta justificada em caso de luto gestacional, de acordo com a qual a trabalhadora pode faltar ao trabalho por motivo de luto gestacional até três dias consecutivos, tendo o outro progenitor igual direito.

 

Pode o trabalhador substituir faltas por renúncia a dias de férias ou prestação de trabalho em acréscimo?

Sim, dentro dos limites legais, o empregador deixa de poder opor-se ao pedido do trabalhador de substituir a perda de retribuição por motivo de falta por renúncia a dias de férias ou prestação de trabalho em acréscimo.

 

2.7 Cessação do contrato de trabalho

O que muda na extinção dos créditos laborais?

Os créditos laborais deixam de poder ser extintos por meio de remissão abdicativa, salvo através de transação judicial.

 

Qual a compensação devida pelo empregador pela caducidade do contrato de trabalho a termo certo?

Em caso de caducidade de contrato de trabalho a termo certo por verificação do termo, o trabalhador tem direito a uma compensação correspondente a 24 dias de retribuição base e diuturnidades por ano de antiguidade. No passado, a compensação era de 18 dias de retribuição base e diuturnidades por ano de antiguidade.

 

E a termo incerto?

Vem equiparar-se o critério da compensação em caso de caducidade de contrato de trabalho a termo certo, ou seja, uma compensação correspondente a 24 dias de retribuição base e diuturnidades por ano de antiguidade. No passado, a compensação correspondia a 18 dias de retribuição base e diuturnidades, no que respeitava aos três primeiros anos de duração do contrato, e a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por ano de antiguidade, nos anos subsequentes.

 

Os novos critérios aplicam-se a todos os contratos a termo, nomeadamente, aos que já se encontram em vigor?

Os novos critérios aplicam-se a todos os contratos a termo que caduquem após o dia 01 de maio de 2023.

 

Qual a compensação mínima legal por despedimento coletivo e extinção do posto de trabalho?

Em caso de despedimento coletivo ou de extinção do posto de trabalho, o trabalhador passa a ter direito a uma compensação correspondente a 14 dias (ao invés de 12 dias) de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.

 

Esta compensação aplica-se relativamente à antiguidade em que vigorava a norma anterior?

Não, o novo cálculo da compensação apenas se aplica ao período da duração do contrato de trabalho após 01 de maio de 2023, mantendo-se o anterior critério aplicável ao período de duração do contrato de trabalho antes desta data.

 

É possível recorrer à terceirização de serviços (outsourcing) após um despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho?

O recurso à terceirização de serviços (outsourcing) deixa de ser permitido para a satisfação de necessidades que foram asseguradas por trabalhador cujo contrato tenha

cessado por despedimento coletivo ou extinção do posto de trabalho nos 12 meses anteriores.

 

A ACT passa a ter poderes acrescidos em matéria de fiscalização de despedimentos?

Sim, se a Autoridade para as Condições do Trabalho considerar um determinado despedimento ilícito, passa a poder participar ao Ministério Público para efeitos de instauração de procedimento cautelar de suspensão do despedimento.

 

2.8 Estágios profissionais

O subsídio de estágio mantém-se?

O subsídio mensal de estágio dos estágios profissionais extracurriculares passa a ser, no mínimo, correspondente a 80% da RMMG (608€). Até agora, este valor correspondia ao valor do IAS (480,43€).

 

Impendem sobre os estágios obrigações contributivas?

Os estagiários passam a ser equiparados a trabalhadores por conta de outrem para efeitos de segurança social, pelo que passam a ser devidas as respetivas contribuições e quotizações.

 

As entidades promotoras têm novas obrigações em termos de seguros?

As entidades promotoras do estágio passam a ter de contratar seguros de acidentes de trabalho.

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