03.01.2024

Áreas de Prática: Financeiro

Entrada em vigor das novas regras relativas a Obrigações Verdes Europeias (European Green Bonds)

No passado dia 30 de novembro de 2023 foi publicado, no Jornal Oficial da União Europeia, o Regulamento (UE) 2023/2631 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de novembro de 2023, relativo às Obrigações Verdes Europeias e à divulgação opcional de informação relativamente a (i) obrigações comercializadas como sustentáveis do ponto de vista ambiental e (ii) obrigações ligadas à sustentabilidade (“Regulamento”).

O Regulamento surge no contexto da publicação do Plano de Ação: “Financiar um Crescimento Sustentável e faz parte do pacote de iniciativas do Pacto Ecológico Europeu, que definiram como objetivo a implementação de uma norma para obrigações sustentáveis do ponto de vista ambiental, a fim de aumentar ainda mais as oportunidades de investimento e facilitar a identificação dos investimentos sustentáveis do ponto de vista ambiental através de uma rotulagem.

Ao mesmo tempo, as normas e os rótulos da EU para os produtos financeiros sustentáveis visam conferir maior credibilidade e confiança nestes produtos nos mercados financeiros.

 

Principais aspetos:

Com o objetivo de facilitar a comparação entre produtos e combater o greenwashing, o Regulamento vem estabelecer:

  1. Um conjunto uniforme de requisitos para os emitentes de obrigações que pretendam utilizar a designação «Obrigação Verde Europeia» («European Green Bond» ou «EuGB»);
  2. Um sistema de registo e supervisão das empresas que atuam como verificadores externos das Obrigações Verdes Europeias; e
  3. Modelos para a divulgação opcional de informações relativamente a (i) obrigações comercializadas como sustentáveis do ponto de vista ambiental e (ii) obrigações ligadas à sustentabilidade (sustainability-linked bonds).

 

O que são Obrigações Verdes Europeias?

As obrigações verdes, sendo valores mobiliários representativos de dívida, têm a particularidade de as suas receitas serem afetadas a atividades económicas que contribuam para um objetivo ambiental.

Desde que cumpra os requisitos previstos no Título II do Regulamento, uma obrigação verde poderá ser designada como “EuGB” ou “Obrigação Verde Europeia” se os emitentes utilizarem as receitas dessas obrigações para financiar atividades sustentáveis do ponto de vista ambiental que estejam alinhadas com os objetivos ambientais estabelecidos no Regulamento da Taxonomia ou que, por outro lado, contribuam para a transformação de determinadas atividades de forma a que estas se venham a tornar sustentáveis do ponto de vista ambiental.

 

É possível emitir obrigações rotuladas como ESG ou sustentáveis sem aplicar o Regulamento?

Sim, desde que não sejam transacionadas como Obrigações Verdes Europeias ou EuGB.

Sem embargo, o Regulamento disponibiliza modelos de divulgação opcional para a emissão de obrigações sustentáveis do ponto de vista ambiental e obrigações ligadas à sustentabilidade (sustainability-linked bonds).

 

Que entidades podem emitir Obrigações Verdes Europeias?

Podem emitir Obrigações Verdes Europeias: empresas financeiras, empresas não financeiras, e até entidades não empresariais, tais como entidades soberanas ou entidades municipais, do Espaço Económico Europeu ou de países terceiros.

Não obstante, as jurisdições de países terceiros não cooperantes para efeitos fiscais ou de países de risco elevado e os emitentes estabelecidos nesses países não podem utilizar a designação de Obrigação Verde Europeia ou EuGB.

No caso de a entidade emitente se consubstanciar numa entidade soberana, serão aplicáveis regras específicas.

Requisitos para a utilização da designação de Obrigação Verde Europeia ou EuGB

 

  1. Utilização das receitas

As receitas (líquidas) da emissão das obrigações devem ser exclusiva e integralmente afetadas antes da maturidade das obrigações, nos termos dos critérios estabelecidos no artigo 3.º do Regulamento da Taxonomia, para financiar uma ou uma combinação das seguintes atividades económicas:

  • Ativos fixos que não sejam ativos financeiros, excetuando-se, em certas condições, as carteiras de ativos fixos ou financeiros alinhados com os requisitos da taxonomia;
  • Determinadas despesas de capital;
  • Determinadas despesas operacionais;
  • Ativos financeiros criados não mais de cinco anos depois da emissão, podendo ser dívida e/ou capital próprio; e
  • Ativos e despesas das famílias.

Importa mencionar que os emitentes podem afetar até 15% das receitas a atividades que embora cumpram os requisitos da taxonomia, não cumpram os critérios técnicos de avaliação, desde que (i) ainda não estejam em vigor no momento da emissão, ou (ii) sejam atividades no contexto de apoio internacional comunicadas de acordo com as orientações, critérios e ciclos de comunicação decididos a nível internacional.

Existem, ainda, regras específicas quanto à utilização das receitas caso sejam afetadas a (i) ativos financeiros ou a (ii) despesas de capital e operacionais, devendo os emitentes, neste último caso, publicar um plano CapEx.

 

  1. Requisitos de Transparência e Verificação Externa

Os emitentes estão sujeitos a requisitos de divulgação específicos e harmonizados, previstos nos modelos de divulgação do Regulamento, que conduzem a uma maior transparência no que respeita à afetação das receitas, e, ao mesmo tempo, disponibiliza aos investidores todas as informações necessárias para avaliar a utilização das receitas das Obrigações Verdes Europeias e comparar essas obrigações entre si.

Para o efeito, os emitentes de Obrigações Verdes Europeias são obrigados a preencher e a divulgar:

  • Uma ficha informativa sobre a obrigação;
  • Um relatório anual de afetação; e
  • Um relatório de impacto ambiental.

A ficha informativa e o relatório de afetação pós-emissão estão sujeitos a verificação por verificadores externos, antes e depois da emissão da EuGB.

Os verificadores externos, estão dependentes de registo e sujeitos a supervisão da ESMA, incluindo de países terceiros, pese embora estes últimos estejam sujeitos a um regime especial. Por sua vez, a ESMA irá manter um registo de informações de verificadores externos e de verificadores externos de países terceiros, acessível ao público no seu website.

 

Divulgação Prazo de Divulgação Verificação Externa

Modelo de Divulgação

Ficha informativa Pré-emissão: Antes da emissão; Verificação obrigatória, com avaliação e parecer positivo sobre o alinhamento das receitas com os requisitos da Taxonomia e do Regulamento; Anexo I
Relatório de Afetação

Por cada período de 12 meses até à data de afetação total e em caso de qualquer correção;

Se aplicável, até à conclusão do plano CapEx;

Verificação pós-emissão obrigatória do relatório de afetação integral das receitas, e em caso de correção da afetação das receitas.

Avaliação para determinar se a afetação das receitas foi realizada em conformidade com os requisitos da Taxonomia e do Regulamento, bem como da ficha informativa.

Anexo II
Relatório de Impacto Pós-emissão: Após a afetação integral das receitas e pelo menos uma vez durante a vigência das obrigações;

Verificação opcional relativa ao impacto ambiental da utilização das receitas;

A verificação externa deverá determinar se a emissão das obrigações está em linha com a estratégia ambiental mais alargada do emitente e avaliar o impacto das receitas sobre o ambiente;

Anexo III

Estes documentos podem dizer respeito a mais do que uma emissão de Obrigações Verdes Europeias.

A fim de reforçar a transparência perante os investidores, estes elementos e as respetivas verificações externas devem ser publicados no website do emitente, incluindo eventuais alterações ou correções, bem como, quando aplicável, o plano CapEx e/ou a verificação do relatório de impacto.

No que toca ao prospeto, os emitentes terão de elaborar e publicar um prospeto ao abrigo do Regulamento do Prospeto, que designe as obrigações como Obrigações Verdes Europeias ou EuGB, exceto nos casos de obrigações emitidas nos termos do artigo 1.º, n.º 2, alíneas b) e d) do Regulamento do Prospeto.

Os verificadores externos deverão também publicar e disponibilizar nos seus websites as suas verificações, bem como as metodologias e os principais pressupostos utilizados na sua atividade de verificação externa, de forma suficientemente pormenorizada.

 

Obrigações comercializadas como sustentáveis do ponto de vista ambiental e Obrigações ligadas à sustentabilidade (sustainability-linked bonds)

O Regulamento disponibiliza modelos de divulgação opcional relativamente a:

  • Obrigações comercializadas como sustentáveis do ponto de vista ambiental, i.e., obrigações cujo emitente garante aos investidores ou declara através das suas alegações pré-contratuais, qualquer que seja a forma destas, que as receitas da emissão das obrigações são afetadas a atividades económicas que contribuem para um objetivo ambiental; e
  • Obrigações ligadas à sustentabilidade (sustainability-linked bonds), que se consubstanciam, para efeitos do Regulamento, em obrigações cujas características financeiras ou estruturais variam em função do facto de serem alcançados os objetivos de sustentabilidade ambiental predefinidos pelo emitente.

As Autoridades Competentes Nacionais terão alguns poderes de supervisão sobre os emitentes que transacionarem obrigações como sustentáveis do ponto de vista ambiental e obrigações ligadas à sustentabilidade (sustainability-linked bonds), competindo-lhes, primordialmente, assegurar que os elementos divulgados nesses modelos (opcionais) são publicados corretamente.

 

Supervisão dos Emitentes

O Regulamento atribui poderes de supervisão e investigação às autoridades nacionais competentes, que, em Portugal, será a CMVM. Com efeito, a CMVM será responsável por supervisionar o cumprimento das obrigações decorrentes do Regulamento no que toca à emissão de Obrigações Verdes Europeias, tendo, também, poderes de supervisão sobre os emitentes que utilizam os modelos constantes do Regulamento, conforme referido supra.

 

Conclusões

As Obrigações Verdes Europeias, as obrigações comercializadas como sustentáveis do ponto de vista ambiental e as obrigações ligadas à sustentabilidade (sustainability-linked bonds) podem ajudar as empresas a financiar a sua transição para a sustentabilidade.

O Regulamento tem como objetivo assegurar a divulgação de informações coerentes e comparáveis, em conformidade com a legislação da União Europeia em matéria de financiamento sustentável, principalmente no que toca ao Regulamento da Taxonomia, mas em consonância também com o quadro normativo de divulgação de informações em matéria de sustentabilidade, nomeadamente o Regulamento SFDR e a Diretiva CSRD.

O Regulamento, e, em especial, os requisitos necessários para obter a designação de Obrigação Verde Europeia são ambiciosos e exigentes. No entanto, assume-se como um passo importante para aumentar a eficiência do mercado através da redução das discrepâncias, para garantir a fiabilidade da informação que é disponibilizada e aumentar a confiança dos investidores nestes produtos ao mesmo tempo que reduz os custos que os investidores incorreriam para verificar o cumprimento destas obrigações. A outro tempo, o Regulamento vem facilitar a comparação entre produtos e combater o branqueamento ecológico (“greenwashing”), em especial no que respeita às obrigações comercializadas como sustentáveis do ponto de vista ambiental e de obrigações ligadas à sustentabilidade ao disponibilizar modelos de divulgação opcional de sustentabilidade.

 

Próximos passos

O Regulamento entra em vigor no dia 20 de dezembro, e será aplicável a partir de 21 de dezembro de 2024.

Até então, caberá à Comissão adotar os atos delegados para completar o Regulamento, e, ainda, um ato delegado especificando o conteúdo, as metodologias e a apresentação das informações a serem divulgadas pelos emitentes de obrigações comercializadas como sustentáveis do ponto de vista ambiental e de obrigações ligadas à sustentabilidade, bem como publicar orientações para a divulgação voluntária de informação destinados aos emitentes das mesmas.

No mais tardar, também até 21 de dezembro de 2024, a ESMA deverá elaborar e apresentar à Comissão os projetos das normas técnicas de regulamentação.

 

Como podemos ajudar?

A sustentabilidade assume-se como um dos princípios basilares da Abreu Advogados. A equipa de Direito Bancário e Financeiro da Abreu Advogados tem conhecimento e experiência na emissão de obrigações e em matérias relacionadas com sustentabilidade e ESG estando especialmente capacitada para prestar apoio às entidades na emissão de Obrigações Verdes Europeias (e obrigações comercializadas como sustentáveis e sustainability-linked bonds) e no licenciamento de entidades como verificadores externos para efeitos do Regulamento.

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