08.05.2025

Áreas de Prática: Financeiro

Posição das autoridades de supervisão sobre o recurso a finfluencers

O recurso crescente a pessoas com notoriedade que utilizam as plataformas digitais para promover produtos e instituições financeiras junto de um leque alargado de pessoas tem vindo a ganhar importância na tomada de decisões de investimento, tendo já merecido a atenção das autoridades de supervisão nacionais e europeias.

 

  1. O conceito de finfluencer

No seu glossário, a CMVM define os finfluencers como pessoas que usam as suas contas nas redes sociais, websites ou podcasts para divulgar conteúdos sobre temas financeiros (incluindo sobre investimentos) ou para promover produtos e serviços financeiros, podendo influenciar a decisão de investimento com as suas opiniões, informações e/ou recomendações.

O papel dos influenciadores digitais no setor financeiro tem sido objeto de amplo debate, incluindo quanto ao seu tratamento jurídico. Por um lado, o recurso a este método de promoção permite o acesso mais fácil e rápido a informação de interesse para os investidores, promovendo a democratização dos mercados financeiros e facilitando o contacto entre investidores e instituições. Simultaneamente, a informalidade na forma de transmissão de informações e o grande alcance dos finfluencers pode criar dificuldades quanto à propagação de informação incompleta, enganosa ou que não adota os requisitos legalmente estabelecidos para a publicidade a produtos e instituições financeiras.

 

  1. O papel da CMVM

Em Portugal, a CMVM tem assumido um papel eminentemente pedagógico e orientador neste tema, visando clarificar o enquadramento legal aplicável ao conteúdo divulgado por finfluencers, especialmente quando estes abordam instrumentos financeiros.

Numa recente comunicação, disponível online, a CMVM identificou e distinguiu diferentes tipos de conteúdo que podem ser partilhados pelos finfluencers, nomeadamente:

  • Conteúdos de literacia financeira, que têm uma natureza meramente educativa e não se encontram, em princípio, sujeitos à supervisão direta da entidade;
  • Publicidade e prospeção de clientes, que só podem ser prosseguidos por agentes vinculados se as atividades se destinarem à celebração de contratos de intermediação financeira ou à recolha de elementos sobre clientes atuais ou futuros;
  • Consultoria e recomendações de investimento, que constituem atividades reguladas, sujeitas a processos de registo, autorização e supervisão contínua.

A CMVM alerta, no entanto, que a classificação do conteúdo deve ser feita com base na substância e não na forma, sendo irrelevante a mera inclusão de disclaimers.

Quando um finfluencer é contratado para promover produtos ou serviços financeiros, a responsabilidade não recai exclusivamente sobre o influenciador, mas também — e sobretudo — sobre o intermediário financeiro contratante, que deverá:

  • Assegurar que o conteúdo foi previamente aprovado ou elaborado pelo intermediário;
  • Garantir que esse conteúdo está claramente identificado como publicidade;
  • Incluir de forma visível a identificação do intermediário responsável;
  • Formalizar a relação contratual;
  • Proceder à monitorização contínua dos conteúdos publicados, assumindo responsabilidade por qualquer incumprimento regulamentar.

A CMVM sublinha que a contratação de finfluencers não pode, em caso algum, contornar os limites legais aplicáveis à prospeção de clientes. O conjunto de atos próprios dessa atividade — como a personalização do contacto ou a indução à celebração de contratos de investimento — só podem ser realizados por agentes autorizados e registados.

 

  1. A perspetiva do Banco de Portugal

O Banco de Portugal, tem investido em iniciativas de literacia financeira e apelado publicamente ao uso de fontes fiáveis e devidamente autorizadas como forma de obter aconselhamento.

O Banco de Portugal defende uma resposta coordenada entre reguladores, que tenha em conta o papel das plataformas digitais na disseminação de conteúdos financeiros. A integração de esforços com a CMVM e os reguladores europeus é fundamental para garantir uma abordagem harmonizada, eficaz, equilibrada e centrada na proteção dos investidores em produtos financeiros.

Foi também tornada pública a adoção de ferramentas de inteligência artificial pelo Banco de Portugal para fiscalizar a publicidade digital, com o objetivo declarado de conseguir maior visibilidade sobre a atividade dos finfluencers.

 

  1. O Parecer do Securities and Markets Stakeholder Group da ESMA

A recente comunicação da CMVM está alinhada com o Parecer do Securities and Markets Stakeholder Group para a ESMA, de 14 de março (ESMA24-229244789-4704), sobre digitalização e proteção de investidores de retalho, onde se alerta para uso de práticas manipulativas como:

  • Dark Patterns[1];
  • Gamification; e
  • Arquitetura digital de escolhas que podem distorcer decisões de investimento, especialmente entre investidores menos experientes.

Nesse parecer, o Grupo recomenda ainda que a ESMA emita orientações claras sobre o marketing digital, obrigando à divulgação transparente das atividades de finfluencers e responsabilizando as entidades que os contratam.

 

  1. Conclusões

Ainda que não haja regulamentação específica para a atividade dos finfluencers, as autoridades de supervisão nacionais e europeias têm vindo a prestar atenção crescente a este fenómeno que é suscetível de influenciar a tomada de decisões de investimento de um leque alargado de pessoas devido à utilização de redes sociais e outras plataformas digitais.

Os intermediários financeiros e demais instituições financeiras devem estar preparados para monitorizar e garantir condições contratuais adequadas na utilização de finfluencers para mitigar o risco de imputação de responsabilidades emergentes das suas atividades. Mesmo que não recorram a finfluencers, os intermediários financeiros e demais instituições financeiras também deverão estar atentos à informação que sobre eles e os seus produtos é divulgada nas redes sociais.

Definidos no Regulamento dos Serviços Digitais como “práticas que distorcem ou prejudicam de forma substancial, intencional ou de facto, a capacidade dos destinatários do serviço de fazerem escolhas ou decisões autónomas e informadas. Estas práticas podem ser utilizadas para persuadir os destinatários do serviço a adotar comportamentos indesejados ou decisões indesejadas que tenham consequências negativas para eles.”

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[1] Definidos no Regulamento dos Serviços Digitais como “práticas que distorcem ou prejudicam de forma substancial, intencional ou de facto, a capacidade dos destinatários do serviço de fazerem escolhas ou decisões autónomas e informadas. Estas práticas podem ser utilizadas para persuadir os destinatários do serviço a adotar comportamentos indesejados ou decisões indesejadas que tenham consequências negativas para eles.”

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