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O que esperar da Casetext?

A startup californiana Casetext é a sensação do momento. A Thomson Reuters vai desembolsar a astronómica quantia de 650 milhões de dólares para adquirir o seu poder de controlo. O diamante da Casetext chama-se “CoCounsel”, um assistente jurídico de inteligência artificial que utiliza o ChatGPT-4, da OpenAI.

Claro que até aí nenhuma novidade, pois já existe uma corrida das lawtechs para embarcar a inteligência artificial generativa nas suas plataformas, principalmente nas suas enterprise resource planning (erp´s).

Porém, a aquisição é muito mais do que estratégica, na medida em que oferecer soluções em IA gerativa é um caminho inexorável. A Thomson Reuters, na verdade, passará a oferecer todos os seus demais serviços para mais de dez mil escritórios de advocacia, sendo este atualmente o número de clientes da Casetext.

Evidentemente, e como em qualquer operação de fusão e aquisição clássica, o interesse da Thomson Reuters pela Casetext já é de longa data e foi precedida de prévia e rigorosa avaliação dos benefícios, principalmente competitivos, oferecidos pelo “CoCounsel”. Diante de um mercado com aguda simetria, o “CoCounsel” cativou e, claro, chamou a atenção pelo seu gigante valuation, não só pelo seu extenso data base referido, mas também e, principalmente, por chegar mais perto da automação de determinadas tarefas, como a revisão de documentos em geral, a elaboração de pesquisas legais, a preparação para depoimentos e a análise de contratos em curto espaço de tempo.

Essa capacidade de execução, aliada à já sabida virtude do ChatGPT-4 em processar grandes volumes de dados jurídicos de maneira eficiente, tornam a Casetext e, claro, o “CoCounsel”, no mais alto flerte da interseção entre direito e tecnologia. Será que finalmente a prestação dos serviços jurídicos conseguirá atingir um nível escalável e menos dependente do capital humano?

O assunto, de fato, não é uma novidade. Há poucos anos atrás, a lawtech Atrium prometia revolucionar os serviços jurídicos. No seu discurso, levantou mais de setenta milhões de dólares no negócio, mas que pouco tempo depois anunciou uma tal reestruturação estratégia, um eufemismo para deixar de queimar dinheiro dos investidores.

Justin Kan, seu fundador, é figura conhecida no mercado de tecnologia: foi um dos criadores do “Justin.Tv”, site que reproduzia indevidamente transmissões desportivas e que deu muita dor de cabeça para as broadcasters. Ou seja, um transgressor por essência. Porém, é possível listar alguns pecados cometidos por Kan, entre eles:

  1. Não sendo advogado, subestimou o mercado juridico, nivelando-o como um outro qualquer onde haveria a captura de uma oportunidade (ao contrário da Casetext);
  2. As falhas do mercado juridico ainda dependem e serão superadas através do capital humano (ou não, se depender da Casetext e do “CoCounsel”/ChatGPT-4);
  3. Vislumbrar exponencialidade numa atividade que procura customização. Só templates não bastam (será que o “CoCounsel” conseguirá superar esse obstáculo, até então intransponível?);
  4. Abundância de plataformas com mesmo modelo explorado pela Atrium. Concorrência alta com procura relativamente uniforme (será que a Casetext conseguirá ser tão distinta assim em pleno oceano vermelho?);
  5. Lentidão na percepção de que cada vez mais as plataformas migrarão para o modelo do “one stop mart” (potencial visto pela Thomson Reuters);
  6. E, claro, valuation superestimado e desproporcional (Será que a Casetext, uma startup, vale tanto?).

Os exemplos do passado orientam o comportamento futuro. Os equivocos cometidos por Kan, um empreendedor serial rodado e bem-sucedido, certamente serviram de referência para os founders da Casetext. Vamos acompanhar como se comportará o “CoCounsel” e se de fato conseguirá atingir o maior desafio do mercado jurídico: de automatizar tarefas que exigem capital humano na sua essência. Mas fica a dica: compreender o mercado juridico não é para amadores.

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