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Três caminhos para inovar no mercado jurídico por Isabel Parker

Isabel Parker é daquelas “fora da curva” no mercado das legaltechs. Foi vencedora na categoria de serviços profissionais do European Women of Legal Technology Awards 2020. Listada como uma das dez principais advogadas inovadoras no FT Innovative Lawyers Report de 2018 e, durante o seu mandato como Chief Legal Innovation Officer na badalada banca Freshfields, o escritório foi eleito o mais inovador da Europa em 2019.

No seu livro Successful Digital Transformation in Law Firms: A Question of Culture, Parker literalmente abre o jogo e traz os caminhos e os segredos para um escritório de advocacia inovar e alcançar o tão almejado sucesso da transformação digital. De imediato, Parker provoca: Por que os escritórios de advocacia são (ou ainda são) céticos com relação a adoção de uma agenda inovadora e digital? Segundo a jurista britânica, temos três respostas para essa pergunta.

A primeira é para o fato de que os escritórios de advocacia em geral estão ganhando dinheiro, o que sugere que o modelo de negócio funciona. Por que consertar algo que não está quebrado? Não se nega que muitos escritórios são lucrativos, principalmente os que estão no topo. Porém, a ideia difundida pelo economista austríaco Joseph Schumpeter, da “destruição criativa”, consistente em que o mercado não é estático e sempre em constante evolução, de modo que novos produtos ou serviços florescem e substituem os existentes, se tornou uma máxima no mercado jurídico. Sai de cena, portanto, o clássico futebolístico “time que está ganhando não se mexe”, para o que chamamos de “Organizações Infinitas”, onde a todo momento é preciso se reiventar. A propósito, o termo “reiventar” foi adotado pelo escritório global Baker & McKenzie para nomear os seus projetos em inovação.

A segunda resposta está relacionada a experiência. A experiência da prestação dos serviços jurídicos não têm paralelo com uma mercantilização, afinal não estamos diante de uma commodity. De fato, há uma lógica no sentido de que os serviços jurídicos são prestados sob medida, altamente customizáveis, uma espécie de taylor made. Logo, não seriam passíveis de automação absoluta. Mas, convenhamos, nem tudo o que o advogado faz é complexo, único e escasso. Parker, inclusive, provoca, ao afirmar que os advogados são justificadamente orgulhosos de sua experiência profissional e, em uma certa medida, podem se sentir desconfortáveis em admitir que uma parte significativa do seu trabalho nem é realmente tão especial. Isso sem contar em um elemento de arrogância profissional, haja vista que nem os escritórios do topo estariam isentos da inexorável transformação provocada pelas legaltechs. Neste ponto, inclusive, podemos fazer um paralelo com o também jurista britânico, Richard Susskind que, desde 2012, no clássico Tomorrow´s Lawyers, já advertia pela necessária mudança de mindset dos operadores de direito em geral. Logo, a tal da experiência taylor made é pressionada por uma espécie de “mais por menos”. Ou seja, os clientes estão pressionando mais por um melhor valor e estão cada vez mais procurando encontrar esse valor em provedores que não são parcerias tradicionais de escritórios de advocacia e, claro, oferecer preços mais baratos e competitivos. Entre elas, as legaltechs dedicadas para gestão e automação de contratos, pesquisa jurídica, classificação e “leitura” de documentos, análise de dados (analytics), prática jurídica, compliance, gestão do contencioso, e-discovery, e-billing (gestão dos honorários), e muitas e muitas outras plataformas.

Já a terceira resposta é baseada na marca. De fato, é um dos principais ativos de um escritório e estabelece relações mais profundas com os clientes, afinal o que está em jogo é a confiança e que não pode ser copiada pelos concorrentes. Contudo, a tal força inexorável da tecnologia poderá corroer essa relação de confiança pelo simples fato de que os negócios do cliente estão em abrupta transformação tecnológica e, por consequencia, os seus prestadores de serviço também deverão acompanhar essa lógica. Ou em uma espécie de cadeia de dominós. Parker, a propósito, diz que se o cliente não puder ver o advogado de cabelos grisalhos inteligentemente adequado e suscetível a tais mudanças, uma espécie de tech friendly, certamente refletirá se será preciso pagar por um Rolls Royce quando só se precisa de um Mini Cooper.

Parker, que hoje lidera às praticas de legaltechs na Deloitte, e citando o ex-CEO da Intel, Andy Groove, reflete se apenas os paranóicos sobrevivem, e nos convida a responder uma série de perguntas em sua obra, uma espécie de manual prático a ser seguido por todos àqueles que pretendem inovar no mercado jurídico. Uma leitura típica daqueles livros de cabeceira.

Por fim, fica a dica para assistir a palestra da jurista britânica no Lisbon, Law & Tech de 2022 (link), que apresenta ainda mais caminhos para o futuro das organizações legais. E, embora Parker não seja uma taylor, na acepção da palavra, a sua obra, que já se tornou um clássico, nos faz lembrar de Coco Chanel, que dizia “Não se pode ser inovador para sempre. Eu quero criar clássicos.”

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