
01.06.2021
Áreas de Prática: Financeiro
Proposta de Alteração ao Código dos Valores Mobiliários
No passado dia 14 de maio, deu entrada no Parlamento a Proposta de Lei n.º 94/XIV/2.ª (“Proposta”), da autoria do Governo, que propõe, entre outras, a 39.ª alteração ao Código dos Valores Mobiliários (“CVM”)[1].
É previsível que as alterações ao CVM sejam aprovadas durante o ano de 2021.
Na presente Newsletter, destacamos as principais novidades avançadas pela Proposta de Alteração.
“Com vista a aumentar a competitividade e o desenvolvimento do mercado de capitais português, a revisão projetada prossegue objetivos de simplificação, de redução de encargos e barreiras regulatórias e de previsibilidade na atuação do supervisor, sempre com a necessária salvaguarda da proteção dos investidores e da integridade do mercado.”
Principais Novidades
1. Eliminação da figura de sociedade aberta
Por não ter paralelo em outros ordenamentos jurídicos, é eliminada a figura de sociedade aberta.
As sociedades abertas que revistam esta qualidade na data de publicação desta lei continuarão a reger-se pelas normas legais e regulamentares vigentes até 31 de dezembro de 2022.
2. Direitos de voto e Percentagem de Capital
Prevê-se a possibilidade de emissão de ações com direito ao voto plural. As sociedades emitentes de ações admitidas à negociação em mercado regulamentado ou em sistema multilateral poderão emitir ações com direito especial ao voto plural, até ao limite de cinco votos por cada ação.
No plano do regime de participação e votação em assembleias gerais há alterações a evidenciar. Nas assembleias das sociedades emitentes de ações admitidas à negociação em mercado regulamentado, o direito de voto sobre matérias que constem da convocatória pode ser exercido por correspondência.
Os acionistas poderão nomear, para cada assembleia geral, diferentes representantes relativamente às ações detidas em diferentes contas de valores mobiliários.
Se os votos forem expressos por via eletrónica, a sociedade emitente envia confirmação eletrónica da receção dos votos à pessoa que os remeteu. Sendo assim, deverá informar o investidor por conta de quem o acionista é titular das respetivas ações sobre se os votos foram validamente registados e contabilizados, até 30 dias após a assembleia geral, e de forma gratuita.
No plano do contencioso, cumpre destacar que a providência cautelar de suspensão de deliberação social passa a poder ser requerida por acionistas que, isolada ou conjuntamente, sejam titulares de ações correspondentes a, pelo menos, 0,5% do capital social.
3. Ofertas públicas
Neste capítulo, importa destacar a eliminação do duplo limiar para exercício do direito de aquisição potestativa, que passa a ser 90% do capital.
Prevê-se também a transparência na atuação dos administradores da sociedade visada para prevenir situações de conflitos de interesses, eliminando-se obstáculos ao aparecimento de ofertas concorrentes que apresentem condições mais favoráveis aos destinatários dessas ofertas.
Concomitantemente, o dever de lançamento de OPA deixa de ser obrigatório caso estejamos perante transmissão de controlo mortis causa.
Por forma a desburocratizar o processo de admissão à negociação, é eliminado o regime de intermediação obrigatória em ofertas públicas de admissão.
As regras supracitadas não se aplicarão a valores mobiliários emitidos por organismos de investimento coletivo; Bancos centrais de um dos Estados-Membros e pelo Banco Central Europeu.
4. Certificado de legitimação
Foi criada a figura dos certificados de legitimação, com o intuito de fomentar o exercício de direitos dos acionistas.
Através deste mecanismo, permite-se que os beneficiários efetivos dos valores mobiliários possam exercer diretamente os direitos dos acionistas.
Pretende-se, desta forma, superar as dificuldades que têm sido referenciadas pelos investidores que pretendem exercer o seu direito de voto nas assembleias gerais de sociedades “cotadas” nacionais em alternativa à sua representação pelos bancos custodiantes.
Neste contexto, o Código dos Valores Mobiliários, aditado pela Proposta, passa a prever a emissão de certificados de legitimação para o exercício de direitos de voto por pessoa distinta do titular quando:
- Seja pedido por quem tenha legitimidade para o registo;
- Conste do certificado a sua data de emissão, a categoria dos valores mobiliários, a identificação do titular da conta e da pessoa legitimada, os direitos que esta última está legitimada a exercer e, se for o caso, o prazo em que o pode fazer;
- Se proceda ao bloqueio dos valores mobiliários em relação aos quais se emita o certificado.
5. Participações qualificadas
A CMVM organizará um sistema de difusão de informação acessível ao público que pode integrar, entre outros aspetos, informação constante dos seus registos, assim como decisões com interesse público ou outra informação que lhe seja comunicada pu por si aprovada sobre participações qualificadas.
Paralelamente, os emitentes de ações admitidas à negociação em mercado regulamentado em Portugal divulgarão, em capítulo do relatório anual de gestão, um relatório detalhado sobre a sua estrutura e práticas de governo, nomeadamente quantas participações qualificadas no capital social da sociedade.
Seguindo o propósito de uniformização de procedimentos ao nível europeu quanto a deveres de informação sobre participações qualificadas, a Proposta prevê o cálculo de apuramento de uma participação qualificada de acordo com a legislação da União Europeia sobre estas matérias.
Caso estejamos perante participações qualificadas não transparentes, isto é, que não foram comunicadas em cumprimento do previsto no CVM, a CMVM passará a notificar os interessados, os órgãos de administração e fiscalização e o presidente da mesa da assembleia geral da sociedade em causa e informa o mercado.
Concluindo, no âmbito das suas competências de supervisão prudencial, a CMVM poderá adotar as medidas necessárias à salvaguarda da sua solidez financeira, do interesses dos investidores e da estabilidade do sistema financeiro e do mercado. Neste contexto, poderá inibir o exercício de direitos de voto por parte de acionistas ou titulares de participações qualificadas.
6. Regulação e Supervisão
A regulação e supervisão dos mercados financeiros são objeto de diversas inovações que perseguem uma dupla função: simplificar processos e incrementar a proteção dos investidores.
A proposta propõe dotar a CMVM de poderes para supervisionar os requisitos de idoneidade, qualificação e experiência profissional dos membros dos órgãos sociais e idoneidade dos sócios de sociedades de revisores oficiais de contas.
Por outro lado, a CMVM fiscalizará as funções de interesse público desenvolvidas em Portugal e que integram o ROC, as SROC, auditores e entidades de auditoria de Estados membros e de países terceiros.
Quanto à proteção dos investidores, a CMVM poderá determinar a divulgação de dados sobre situações identificadas e acerca de conclusões referentes ao controlo de qualidade sempre que o considere relevante para o público ou para a eficácia da supervisão.
[1] Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de novembro.
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