31.05.2022

A relevância do local de trabalho na aplicação da convenção colectiva

Artigo originalmente publicado em Estudos dedicados ao Professor Doutor Bernardo da Gama Lobo Xavier, “DIREITO E JUSTIÇA, REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE CATOLICA PORTUGUESA”

 

1º Considerações prévias[1/2]

1.1. Generalidades
I. Compulsando a Constituição Portuguesa facilmente se constata que o Estado não detém o monopólio da elaboração normativa (v.g., artigos 56.º, n.º 3, 227.º e 241.º). De facto, o nosso ordenamento apresenta uma concepção pluralista da produção jurídica, em especial, no que respeita às condições de trabalho, o que demonstra que o Estado não possui o exclusivo da produção normativa[3]. Assim sendo, cabe invocar, desde logo, a autonomia normativa que confere a determinadas entidades intermédias, nomeadamente às associações de trabalhadores e de empregadores, “… uma verdadeira potestas normandi, ou seja, um poder de criação de autênticas regras de conduta, de atribuição de direitos e deveres relacionados com a sua situação de assalariados (artigo 56º/3)” da Constituição[4].

II. A autonomia colectiva, mais exactamente o direito de contratação colectiva, corolário natural da liberdade sindical, encontra, como decorre do exposto, arrimo na Constituição (artigo 56º, n.º3), tal como em diversos documentos internacionais[5] Prescreve a Lei Fundamental, no preceito referido, que “compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei”.
Pode, então, inferir-se que o poder normativo das associações sindicais e de empregadores[6] se alicerça directamente na Constituição, sendo  assegurado pela lei. Ou seja: com base no preceito constitucional, o direito de contratação colectiva não necessita do posterior reconhecimento de qualquer acto infraconstitucional, cabendo apenas à lei garanti-lo, conforme prescrição constitucional[7].

III. Celebrada por associações de direito privado, como são consideradas as associações sindicais e de empregadores, a convenção colectiva[8], depois de uma fase de negociação (artigos 486.º e ss), e para que possa produzir os efeitos legalmente previstos, tem de ser depositada nos serviços do Ministério do Trabalho (artigos 494.º e 495.º).
Não ocorrendo nenhum dos casos taxativamente previstos no Código do Trabalho para a recusa do depósito, segue-se a publicação da convenção no Boletim do Trabalho e Emprego (artigo 519.º, n.º 1 e 3); uma vez publicada, a convenção entra em vigor nos mesmos termos das leis (artigo 519.º, n.º 1, in fine)[9].

IV. Completado o ciclo final de procedimento da convenção – i.e., depósito, publicação e entrada em vigor-, esta produz os efeitos legais e convencionalmente previstos; o facto de esses efeitos serem, em regra, gerais e abstractos[10], impõe que se considere estarmos, situação que também já decorria do anteriormente exposto, ante uma fonte específica de Direito do Trabalho, posição que tem, como decorre do artigo 56.º, n.º 4, in fine, da CRP, e do artigo 1.0, acolhimento no direito positivo[11].

 

1.2. Delimitação do Objecto
I. É comum analisar a eficácia da convenção colectiva com base em três elementos gerais (âmbitos) que delimitam os seus efeitos: por um lado, o âmbito subjectivo (artigo 496.º e ss); por outro, o âmbito temporal (artigos 499.º e ss); e, ainda, o âmbito geográfico [artigo 492.º, n.º 1, alínea c), in fine] [12].

II. Julgamos, no entanto, que o âmbito espacial está implícito no princípio da filiação (artigo 496.º) [13].
O Código do Trabalho delimitou a aplicação da fonte convencional através do princípio da filiação (epígrafe do artigo 496.º) [14/15] ou princípio da dupla filiação [16].
Em nossa opinião, este princípio tem subjacente um conjunto de situações que carecem de decomposição. Com efeito, é necessário identificar realidades ou pressupostos diversos sob a expressão geral daquele princípio e que se prendem com vários elementos, tais como a condição de filiado (pessoal), o âmbito territorial (geográfico), o sector de actividade e a profissão abrangido (funcional) e o momento determinante de produção de efeitos da filiação (temporal).

III. Na verdade, cabe sublinhar que no âmbito da liberdade sindical, o trabalhador (subordinado) tem o direito de se inscrever[17] em sindicato que, na área (espacial) da sua actividade (ou profissão), represente a categoria respectiva (artigo 444.º, n.º 1) [18], o mesmo acontecendo com o empregador (artigo 444.º, n.º 3) e com as correspondentes associações [19].
A entidade em causa terá, desde logo, de agir de acordo com os âmbitos subjectivo (profissional), objectivo (sector de actividade) e geográfico (territorial) que estão previstos nos estatutos [artigo 450.º, n.º 1, alínea a)].

IV. Importa sublinhar que, com excepção do elemento pessoal (da filiação), os restantes pontos não são objecto de regulação legal expressa, impondo o legislador a indicação destas matérias [artigo 492.º, n.º 1, alínea c)][20], gerando recusa do depósito a sua ausência [artigo 494.º, n.º 4, alínea c)].
A obrigação destas indicações visa permitir, desde logo, por parte da Administração laboral, o controlo da legitimidade dos outorgantes[21] e deixar claro que está subjacente ao princípio da filiação um espaço delimitado de regulação (geográfico), na qual se inclui a materialidade das actividades (económica e profissional) efectivamente exercidas pelos titulares do contrato de trabalho.

V. É sobre o elemento espacial que o presente texto incide, tendo o intuito de definir algumas linhas orientadoras no que respeita ao território nacional[22], em particular quando opera uma transferência do local de trabalho (definitiva vs temporária).
Está, por isso, afastada desta análise a aplicação da convenção a situações internacionais[23], tal como o estudo do conteúdo da fonte colectiva

 

2.º Âmbito espacial da convenção colectiva
I. O horizonte territorial está, como vimos, implícito na aplicação do princípio da filiação. Para além da relevância em termos negociais[24], o âmbito espacial é ainda importante por delimitar as situações jurídicas que são reguladas pela fonte convencional. Estamos, deste modo, perante um limite do poder normativo dos outorgantes.

II. Apesar da pouca atenção que a matéria tem merecido – tanto por parte da doutrina como da jurisprudência, eventualmente demonstrativa de que os destinatários da convenção não têm encontrado aqui especiais dificuldades – não podemos ignorar que o assunto gera problemas de difícil resolução, considerando-se a sua simplicidade[25] meramente aparente. Os outorgantes têm como limite regulatório a intersecção do âmbito geográfico previsto nos seus estatutos e expresso na sua denominação [artigo 450.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3]. Dito de outro modo: a autonomia colectiva tem como circunscrição máxima o espaço geográfico de intersecção abrangido pelas associações outorgantes[26], sob pena de ilegitimidade destas; inversamente, nada impede que possam restringir o âmbito espacial de regulação, optando as partes por reduzir a sua intervenção (por exemplo, a uma empresa, estabelecimento[27] ou localidade )[28].
Perante isto, e o facto de caber às partes a indicação do “âmbito geográfico”, surge como decorrência natural que estas possam proceder à delimitação espacial da convenção[29], sem prejuízo, reiteramos, dos limites decorrentes da representação das entidades outorgantes e, por outro, de normas imperativas[30]. Ou seja: dentro deste quadro delimitativo, as partes da convenção colectiva têm liberdade para definir o espaço de regulação, fixando o âmbito territorial da fonte; e, deste modo, cabendo-lhes designar o âmbito geográfico, constituindo este elemento um modo de delimitar a aplicação da fonte convencional, os outorgantes podem escolher uma área específica para determinar a aplicação do instrumento convencional, incluindo, por exemplo, a definição de um local de trabalho apenas para este efeito[31].
De facto, esta é a posição que melhor se adequa ao espaço de liberdade que constitui a autonomia colectiva e, por outro lado, à prescrição legal que determina o dever de as partes indicarem o âmbito geográfico de aplicação [artigo 492.º, n.º 1, alínea c)], porquanto constituiria uma restrição desnecessária e, portanto, uma afectação da auto-regulação, se não pudessem delimitar efectivamente a territorialidade, adequando a regulação estabelecida ao espaço que considerarem que melhor satisfaz os seus objectivos, atendendo, por exemplo, a factores sociais e económicos.

III. Está então a cargo da autonomia colectiva a definição do âmbito espacial da convenção[32]. Temos, no entanto, de ter presente que a doutrina tem comummente apontado o local de trabalho como elemento de conexão para efeitos de aplicação da fonte convencional[33] , o que significa que estaremos perante um factor determinante e delimitativo do âmbito regulatório da convenção[34].
Esta posição poderá ser mantida, mas apenas perante a ausência de vontade das partes, i.e., se estas não tiverem identificado (expressa ou tacitamente), dentro do espaço geográfico e com respeito das normas imperativas, um ou mais elementos específicos de conexão[35]. E, nestes termos, o local de execução do contrato de trabalho[36] condicionará espacialmente a aplicação da convenção colectiva, uma vez que, reitere se, o que está em causa são os limites territoriais da fonte resultantes da área de representação dos outorgantes, o que significa que a autonomia colectiva tem este espaço como limite.
Na verdade, e perante a não intervenção da autonomia colectiva, julgamos que esta posição – local de trabalho como elemento de conexão – surge como natural e é a que melhor se adequa ao quadro do Código do Trabalho. Comecemos por ter presente que este diploma tem como pressuposto de inscrição do filiado a área da sua actividade (artigo 444.º, n.º 1 e 3)[37]; por outro lado, saliente-se a relevância concedida pelo legislador laboral ao local de trabalho (por exemplo, artigos 193.º e ss e 277.º, n.º 1), da qual decorre a sua importância também em matéria de determinação da fonte convencional aplicável, reconhecendo-se que esse espaço físico corresponde normalmente à localização da empresa (unidade técnico-laboral)[38]. E isto porque parece claro que na regulação das situações jurídicas (activas e passivas) realizadas pela fonte convencional assume especial relevo o espaço em que o contrato de trabalho é executado, porquanto é no local de trabalho que quotidianamente a prestação se materializa e o contrato se desenvolve, justificando-se, deste modo, que aquele releve como elemento de ligação entre a fonte convencional e as situações conformadas por esta. Também por via negativa, obteremos idêntico resultado. Na realidade, consideramos que outros elementos, tais como o lugar da celebração (do contrato de trabalho ou até mesmo da convenção colectiva)[39] ou a sede dos outorgantes da fonte convencional, não apresentam motivos justificativos para serem qualificados como elemento de conexão. De facto, qualquer um deles traduzir-se-ia na escolha de um elemento meramente formal decorrente de opções aleatórias, nada tendo a ver com o espaço em que o contrato de trabalho é executado, ignorando, por isso, o habitat do seu desenvolvimento, ou seja, o quadro territorial que constitui um elemento essencial para os outorgantes e respectivos destinatários (trabalhador e empregador)[40]; por outro lado, bastaria que existisse uma pulverização de locais de outorga para termos um resultado aplicativo que nada reflectiria em termos de prestação laboral.

IV. Tomando o local de trabalho como pressuposto geográfico e natural da filiação, a que as partes também poderão recorrer para fixar o âmbito espacial da convenção, aquele elemento pode constituir a nossa base de análise dos limites regulatórios; somos, no entanto, forçados a sublinhar os condicionalismos da apreciação por duas razões: por um lado, devido, como vimos, ao facto de a autonomia colectiva ter nesta matéria um amplo espaço de intervenção; por outro, tendo presente que o conceito de local de trabalho é polissémico, a sua concretização pode assumir diversas variações atendendo aos temas regulados. Estes dois motivos impedem que se obtenham resultados que vão para além de uma orientação geral e sempre face ao silêncio da regulação convencional, pois esta, reiteramos, dentro dos limites de representação dos outorgantes e do respeito das normas imperativas, pode determinar a sua amplitude.

V. Como tem sido sublinhado, o local de trabalho “… não se define por ser um ponto no espaço ou a localização física onde o trabalhador se encontra, mas sim por enunciar o âmbito potencial, em termos geográficos, de realização da prestação”[41] , o que significa então que podemos concretizar a expressão local de trabalho, em termos gerais, como o espaço em que o trabalhador está adstrito a realizar a prestação e o empregador a recebê-la[42]. Acontece, no entanto, que devemos ter presente que, como referimos, para além de um enquadramento geral, o local de trabalho não tem unidade, podendo afirmar-se que as várias normas que o regulam têm subjacentes realidades diferentes[43].
O conceito de local de trabalho – e sem esquecer, por um lado, que compete às partes a sua definição (artigo 193.º, n.º 1) e, por outro, a consagração do princípio da inamovibilidade [artigo 129.0, n.º 1, alínea f)] – pode assim assumir algumas variações consoante a matéria em causa[44], o que o permite qualificar como um conceito varável[45] e eventualmente justificar que se fale antes em “locais de trabalho”; esta questão assume particular relevo quando a convenção colectiva pode abranger um amplo catálogo de matérias que, em regra, não estarão imunes às situações específicas que são objecto de regulação.

VI. Tendo presente a amplitude regulativa em matéria de âmbito espacial da convenção colectiva atrás referida e, por outro lado, dando como adquirido que a noção geral de local de trabalho corresponde ao espaço em que o trabalhador está adstrito a executar a prestação e o empregador a recebê-la, podemos identificar alguns vectores relativo ao âmbito ( espacial) aplicativo da convenção colectiva.
Como referimos, a intersecção do espaço de representação dos outorgantes constitui o limite do âmbito regulativo destes, sob pena de ilegitimidade das partes. Assim, o âmbito geográfico da convenção determinado pelos outorgantes deve situar-se dentro do espaço de representação, podendo naturalmente ficar aquém, uma vez que as partes podem restringir o exercício do seu poder normativo, devendo considerar se que sendo o âmbito geográfico inferior ao espaço de representação, aquelas encontram-se ainda dentro da faculdade de regulação e, portanto, agem no quadro da autonomia colectiva; o que significa que uma convenção colectiva não pode fixar validamente normas que produzam os seus efeitos fora do âmbito de representação das partes, considerando-se inválida as disposições que determinem uma aplicação que o ultrapasse[46].
Quer isto então dizer que se as cláusulas convencionais prevêem (expressa ou implicitamente) a sua aplicação a situações que se encontram fora do âmbito (geográfico) dos outorgantes, as cláusulas em causa serão nulas, devendo ser objecto de redução do âmbito espacial previsto, reconduzindo-se a amplitude do poder normativo ao espaço de representação das partes (artigo 121.º, n.º 2), assim o determinando uma interpretação conforme a lei[47]. Com a nulidade parcial e consequente redução, impede-se que a existência de uma cláusula que exorbita a representação das partes – ou de uma delas – coloque em causa o aproveitamento da fonte, regulando a convenção as situações laborais que se subsumam no espaço de actuação dos outorgantes; aliás, entendimento diverso seria “premiar” o autor- ou autores – do incumprimento da lei, permitindo que a sua violação afectasse a validade de toda a fonte; estamos assim perante uma manifestação do princípio da conservação dos negócios jurídicos[48].

VII. O local de execução da prestação para efeitos de aplicação da fonte convencional deve situar-se dentro dos limites decorrentes, que  do espaço de representação quer da amplitude determinada pelas partes. Deste modo, sabendo que o elemento de conexão a ter em conta para a aplicação da convenção é o local de trabalho e que este condiciona a área territorial de regulação da fonte, podemos afirmar que na situação em que o trabalhador realiza a sua prestação num espaço que se subsuma no âmbito geográfico de representação e, por outro lado, no determinado pelos outorgantes, a aplicação da fonte convencional não coloca acrescidas dificuldades.
E esta clareza aplicativa da fonte, revela-se quer estejamos perante um local de trabalho fixo e claramente delimitado quer o mesmo seja diluído[49], desde que, repetimos, qualquer deles se subsuma no espaço de representação e determinação das partes[50]. Apesar das diferenças e mesmo estando perante um amplo espaço de realização da prestação, este será necessariamente delirnitado[51]. Ou seja: nesta situação estamos ainda dentro do local de trabalho que deverá subsumir-se no espaço circunscrito pela convenção colectiva, sendo a sua regulação o resultado natural da vontade dos outorgantes.

VIII. É importante sublinhar, apesar de resultar do exposto, que a delimitação da zona geográfica da convenção colectiva assume uma perspectiva positiva, estabelecendo o espaço de regulação e consequente aplicação do instrumento convencional; por outro lado, revela também uma vertente negativa, uma vez que constitui o limite regulatório e aplicativo da fonte; estas duas vertentes são indissociáveis do ponto de vista analítico. De facto, estando em causa a aplicação de um instrumento a contratos de trabalho cuja execução se realiza na zona territorial prevista por aquele e para a qual os outorgantes da fonte convencional têm a necessária legitimidade, a sua aplicação constitui o reconhecimento do poder normativo legalmente conferido.
Importa ainda ter presente que estando em causa o elemento de conexão local de trabalho, podem naturalmente existir situações em que este é objecto de modificações, pelo que se impõe apurar as condições em que o poder normativo se mantém e consequentemente se preserva a aplicação da fonte; em suma: está em causa apurar a “elasticidade” do poder regulatório e subsequente aplicação do instrumento convencional perante alterações do elemento de· conexão (local de trabalho )[52].

 

3.º Alterações do local de trabalho
I. É necessário, desde logo, começar por analiticamente destrinçar as alterações definitivas das temporárias (critério temporal). Não parece haver especiais dificuldades em reconhecer que uma alteração definitiva do elemento de conexão (transferência definitiva do local de trabalho)[53] para uma área exterior ao poder regulatório e aplicativo da convenção gerará a inaplicação da fonte; nesta situação, opera-se a desconexão, uma vez que as partes não possuem capacidade normativa ou a convenção não abrange o novo espaço de execução, situando-se as situações jurídicas laborais numa zona “além-fronteiras” convencional. Um dos elementos subjacentes ao princípio da filiação – e, recorde-se, são todos cumulativos[54] – deixou de estar presente, uma vez que o novo espaço de execução do contrato tem de se situar no âmbito de aplicação da convenção, sem o qual inexiste o elemento de conexão e, portanto, falta um dos pressupostos aplicativos[55].
Significa isto, portanto, que para a alteração definitiva do elemento de conexão não gerar a inaplicação da fonte, é preciso que, por um lado, a nova zona territorial se inclua ainda na área de intervenção das partes e, por outro, que a mesma tenha sido concretamente consagrada na convenção colectiva[56], pois, recorde-se, os outorgantes podem ter restringido a sua amplitude regulatória[57]

II. Operando a desconexão, fica ainda uma situação em aberto: saber se o fim da regulação da fonte convencional é imediato ou deve aplicar-se analogicamente o previsto no artigo 496.º, n.º 4.
A nossa posição é de não aplicação do preceito citado e, portanto, preconizamos a cessação imediata da aplicação da fonte. Na verdade, é relevante notar que a referida norma regula a ausência do elemento pessoal da filiação, pressupondo a manutenção dos demais; ou seja: mantém-se a possibilidade de representação laboral, mas em virtude da ausência daquele elemento ela não ocorre. Ora, na situação em apreço, verifica-se a impossibilidade de manutenção de representação, face à ausência de outro elemento que não integra a parte da norma; por outro lado, essa impossibilidade de representação decorre de uma opção das associações em causa, uma vez que definiram estatutariamente os seus limites normativos [artigo 450.º, n.º 1, alínea a)] – ou restringiram o âmbito regulatório da fonte -, escolha que deve ser respeitada; acresce ainda que a zona geográfica é um elemento relevante na ponderação das soluções acordadas, pelo que não pode ser ignorada tal situação.
Em síntese, é necessário respeitar a delimitação (estatutária e convencional) realizada pelas partes, não se devendo impor o que elas, no âmbito da sua autonomia, rejeitaram; e, por isso, a ausência de um pressuposto aplicativo tem como efeito a inaplicação da fonte, salvo quando a lei o disser de forma diferente, o que no presente caso não se verifica.

III. Importa ainda sublinhar que, estando em causa uma deslocação (transitória) do espaço em que habitualmente o trabalhador realiza a prestação e naturalmente o empregador a recebe[58], neste tipo de situações estamos perante a realização da prestação fora do âmbito geográfico habitual[59], tendo o legislador determinado que o trabalhador está obrigado a realizar tais deslocações quando inerentes às suas funções ou indispensáveis à sua formação profissional (artigo 193.º , n.º 2), incluindo-as, portanto, no espaço geográfico de cumprimento da prestação laboral[60].
Não estamos, assim, perante alterações do local de trabalho, inexistindo modificação do elemento de conexão para efeitos de aplicação da fonte convencional[61]. Deste modo, e apesar de o trabalhador poder encontrar se temporariamente fora do âmbito de aplicação da convenção, inexistindo alteração do local de trabalho, não existe fundamento para modificar o quadro normativo aplicável, devendo, por isso, manter-se a uniformização de condições de trabalho dos trabalhadores destinatários do instrumento convencional[62]. Ou seja: a convenção continua a aplicar-se, uma vez que o elemento de conexão (local de trabalho) se mantém inalterado, não havendo justificação para paralisar a aplicação da fonte convencional[63].

IV. Como referimos, a alteração do local poder ser definitiva ou temporária (critério temporal); vimos atrás que a definitiva gerava a inaplicação da fonte convencional quando o novo espaço não se subsumisse no âmbito do poder normativo das partes e no quadro territorial previsto na convenção. Poder-se-á dizer que em quaisquer dos casos estamos perante uma modificação do elemento de conexão, o que deveria produzir os mesmos efeitos em termos aplicativos da fonte. Acontece, no entanto, que há semelhança material entre a deslocação (transitória) do espaço, em que habitualmente o trabalhador realiza a prestação e o empregador a recebe, e a alteração também temporária do local de trabalho (transferência temporária do local de trabalho). Se do ponto de vista formal a diferença é facilmente identificável, porquanto num caso existe um novo local de trabalho e noutro não, devemos apreciar se tal diferença justifica o fim da “soberania normativa” dos outorgantes e o corte aplicativo da fonte convencional.
Consideramos que a materialidade da situação se deve sobrepor ao aspecto formal, pelo que, mesmo havendo uma transferência temporária do local de trabalho, a convenção deverá manter a sua aplicação. De facto, o espaço de realização da prestação continua a ter como referência o local anterior à mudança (temporária), situação que permite falar em alteração (temporária) do local de trabalho; por outro lado, tendo presente a preocupação do legislador com a estabilidade aplicativa no regime convencional, não parece justificar-se esta ruptura regulatória da convenção, em especial, atendendo ao lugar paralelo, que constitui a desfiliação (elemento pessoal, artigo 496.º, n.º 4). Nestes termos, julgamos que as partes mantêm ainda o seu poder normativo e consequentemente a convenção deve continuar a aplicar-se, identificando-se o elemento de conexão com a referência ao local de trabalho que constitui a base referencial ( o anterior à transferência temporária ) [64].

 

 

[1] O presente texto corresponde, com algum desenvolvimento, à conferência proferida no XVIII Congresso Nacional de Direito do Trabalho, em Novembro de 2014.
[2] Todos os artigos sem indicação da fonte referem-se ao Código do Trabalho (versão actual).
[3] JORGE LEITE, Direito do Trabalho, volume I, Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra, 2004, p. 53.
[4] JORGE LEITE, Direito do Trabalho, cit., p. 53.
[5] Entre os diversos textos internacionais, saliente-se, desde logo, da Organização Internacional do Trabalho, em especial: a) Convenção n.º 87, datada de 1948, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 45/77, de 19 de Abril; b) Convenção n.º 98, de 1949, aprovada pelo Decreto-Lei n.0 45 758, de 12 de Junho de 1964; c) Recomendação n.º 91, de 1951.
Importa salientar que existe urna diferente abordagem dos instrumentos internacionais ratificados por Portugal e aquela que é apresentada pela nossa Lei Fundamental.
Com efeito, enquanto as convenções n.º 87 – versa a liberdade sindical e a protecção do direito sindical – e 98 – incide sobre o direito de organização e de negociação colectiva – revelam urna igualdade, no que respeita à sua matéria, de tratamento entre trabalhadores e empregadores, a nossa Lei Fundamental não consagrou expressamente o direito de os empregadores se coligarem através de associações para defesa dos seus direitos e, consequentemente, o direito de contratação colectiva, bem como não faz qualquer referência ao direito de participação na elaboração da legislação do trabalho.
Dizemos que a Constituição não consagrou expressamente tais direitos, pois, pelo menos no que respeita ao direito de contratação colectiva, entendemos que tal faz parte do conteúdo da liberdade de iniciativa económica – na sua vertente de direito de contratação -, que é considerado pela doutrina como um direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias; neste sentido, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, volume I, 4.ª edição, 2007, p. 789 (II); FERREIRA MENDES, em JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2010, p. 1184.
[6] Cfr. nota anterior.
[7] Para urna análise da convenção colectiva no quadro constitucional, GONÇALVES DA SILVA, Da Eficácia da Convenção Colectiva, Dissertação de Doutoramento, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2012, volume II, pp. 589 e ss.
[8] Como se sabe a expressão convenção colectiva abrange, quer os contratos colectivos, quer os acordos colectivos, quer ainda os acordos de empresa, (artigo 2.0, n.º 3).
[9] Sobre a entrada em vigor da lei, cfr. Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro, com diversas alterações.
[10] Neste sentido, BARROS MOURA, A Convenção Colectiva entre as Fontes de Direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 1984, por exemplo, pp. 125 e 129-130. Não ignoramos, contudo, a possibilidade de urna convenção ter urna cláusula individual e concreta, mas será urna excepção e não a regra, sob pena de descaracterização do interesse colectivo.
Sobre a questão, vd. NIKITAS ALIPRANTIS, La Place de la Convention Collective dans la Hierarchie des Nomzes, Bibliotheque d’Ouvrages de Droit Social, Tome XXII, Libraire Generale de Droit et de Jurisprudence, Paris, 1980, pp. 78-79.
[11] Também a jurisprudência tem considerado que a convenção colectiva é fonte de Direito do Trabalho, vd., por exemplo, Acórdão da Relação do Porto, de 8 de Outubro de 1984, Colectânea de Jurispnidência, 1984, n.º 4, pp. 277 e ss; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de Outubro de 1998, Boletim do Ministério da Justiça n.º 480, pp. 205 e ss; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Abril de 2012, processo n.º 229/09.6TTBRR.L1.S1, www.dgsi.pt.
[12] Para uma análise dos preceitos, e com indicações doutrinárias, GONÇALVES DA SILVA, em ROMANO MARTINEZ, LUÍS MIGUEL MONTEIRO, MADEIRA DE BRITO, GUILHERME DRAY e GONÇALVES DA SILVA, Código do Trabalho Anotado, 9.ª edição, Almedina, Coimbra, 2013, respectivas anotações.
[13] Como decorre da denominação do princípio, este refere-se aos sujeitos inscritos nas entidades outorgantes. Não quer isto naturalmente dizer que as partes [artigo 492.º, n.º 2, alínea a)] não sejam abrangidas pelo instrumento convencional, mas apenas que o legislador considerou relevante delimitar o âmbito de aplicação dos filiados, não reconhecendo idêntica necessidade relativamente aos subscritores, o que, aliás, se compreende, uma vez que a repercussão dos efeitos da convenção na sua esfera é manifesta e sem necessidade de qualquer delimitação, regendo-se, na ausência de cláusula convencional e de regra especial, pelas normas aplicáveis aos contratos constantes do Código Civil, na medida em que tal opção não colida com vectores da área laboral. Para mais desenvolvimentos sobre o princípio da filiação, vd., por todos, GONÇALVES DA SILVA, Da Eficácia da Convenção Colectiva, cit., volume II, pp. 1101 e ss.
[14] Sem prejuízo de diversas excepções; sobre o assunto, GONÇALVES DA SILVA, Da Eficácia da Convenção Colectiva, cit., volume II, pp. 1163 e ss.
[15] A eficácia pessoal tem especificidades em diversos países. Por exemplo, na Alemanha, a convenção colectiva tem apenas efeitos interpartes, mais exactamente é obrigatória para os sujeitos outorgantes e respectivos filiados (§§ 3, n.º 1, e 1, n.º 1, Tarifvertragsgesetz, TVG); isto não quer dizer que, na prática, não se aplique a maior parte das vezes a todos os trabalhadores, sendo comum a remissão do contrato de trabalho
para o regime convencional, regulando, naturalmente, como cláusula individual, ULRICH ZACHERT, Lezioni di Diritto del Lavaro Tedesco, Quaderni del Dipartimento di Scienze Giuridiche, n.º 12, Università degli Studi di Trento, 1995, p. 54. Note-se que o diploma tem um amplo âmbito de aplicação, regendo, por exemplo, os trabalhadores que sejam dependentes economicamente (§ 12.ª TVG).
Existe, contudo, uma importante excepção a esta regra: em matéria de questões empresariais e jurídicas de organização democrática da empresa é suficiente o empresário estar vinculado à convenção para ter de cumprir o estipulado no instrumento(§ 3.0, n.º 2, TVG), Trata-se de questões afectas ao âmbito empresarial e a determinadas matérias da BetrVG. Entre essas questões encontram-se, por exemplo, as relativas à segurança e higiene no trabalho ou as que aumentam o direito de codeterminação do comité de empresa; em suma, aquelas que não permitem um tratamento diferenciado em virtude da filiação sindical, cfr. ULRICH ZACHERT, “La Negociación Colectiva en Alemania”, AA.VV., La Negociación Colectiva en Europa, coordenação Ojeda Avilés, Comisión Consultiva  Nacional de Convenios Colectivos, “relaciones laborales”, Ministerio de Trabajo y Asuntos Sociales, Madrid, 2004, p. 45; veja-se ainda sobre os efeitos pessoais da convenção, WOLFGANG DÃUBLER, Derecho del Trabajo, Ministerio de Trabajo y Seguridad Social, Madrid, 1994 (tradução castelhana de M.ª Paz Acero Serna e Pío Acero Lópes), Das Arbeitsrecht, 1 e 2, Rowohlt Taschenbuch Verlag GmbH, Hamburg; 1990, pp. 149-150; HUECK-NIPPERDEY, Compendio de Derecho de! Trabajo, Editorial Revista de Derecho Privado, Madrid, 1963 (tradução castelhana de Miguel Rodriguéz Pifiero e Luís Enrique de la Villa), Grzmdriss des Arbeitsrecht, s.e., 1962, pp. 342-343; VOLKER RIEBLE, “Die Akteure im Kollektiven Arbeitsrecht”, Recht der Arbeit, 2004, Mãrz/April, pp. 81-82; ALFRED SõLLNER, Grundrib des Arbeitsrechts, Verlag Vahlen, Munique, 1994, p. 150.
Por sua vez, e também a título de exemplo, no ordenamento francês, a vinculação do empregador constitui elemento de conexão para ser aplicada a fonte convencional, salvo se a cláusula contratual for mais favorável. Ou seja: é necessário e suficiente que o empregador celebre directamente ou, esteja filiado na associação outorgante, pois caso tal não se verifique, ainda que o trabalhador esteja, a convenção não poderá obrigar aquele a seguir o regime acordado (artigo L. 2254-1 C. Trav.). Nestes termos, a vinculação do empregador a uma convenção colectiva é elemento bastante para que os efeitos desta se produzam na empresa e abranjam quer os trabalhadores filiados quer os não filiados, cfr., por exemplo, JEAN PÉLISSIER, GILLES AUZERO e EMMANUEL DoCKES, Droit du Travai!, Dalloz, Paris, 27e édition, 2013, pp. 1317 e ss. Naturalmente que é também necessário que a actividade da empresa se enquadre no campo de aplicação geográfico e profissional da convenção (artigo 2222-1), cfr., por exemplo, ISABELLE DESBARATS, L ‘Entreprise à Établissements Multiples en Droit du Travai!,. Bibliotheque de Droit Social, tome 28, LGDJ, Paris, 1996, pp. 29 e ss. Por outro lado, sendo o empregador o elemento de conexão, importa ter presente que releva a sua principal actividade, podendo a autonomia colectiva, em caso de pluralidade de actividades e incerteza na aplicação, intervir na matéria, cfr. SERGE FROSSARD, “Application des Conventions Collectives: Les Limites de lá Autodétermination (Quelques Remarques relatives à l’Article L. 132-5-1 du Code du Travai!)”, Droit Social, 2006, n.º 1, pp. 17 e ss, actualmente a matéria está regulada no artigo L2261°2.
[16] Expressão utilizada, por exemplo, por FURTADO MARTINS, “Convenção Colectiva Vertical e Mudança de Actividade da Empresa”, AA.VV., Trabalho e Relações Laborais, «Cadernos Sociedade e Trabalho», n.º 1, Celta Editora, Oeiras, 2001, p. 277; GONÇALVES DA SILVA, Notas sobre a Eficácia Normativa das Convenções Colectivas, «Cadernos Laborais», n.º 1, Instituto de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito de Lisboa, Almedina, Coimbra, 2002, p. 20. Apesar de estar consagrada, a expressão princípio da dupla filiação pode ser equívoca ou mesmo incorrecta tecnicamente, porquanto no acordo de empresa, não há filiação do empregador; por outro lado, se estivermos perante um instrumento outorgado por associação de nível superior, a filiação em “cascata” não se subsume quantitativamente na expressão; finalmente, o elemento especialmente relevante é a representação de sujeitos que ocupam diferentes posições no contrato de trabalho e, por isso, seria mais correcta e explicativa a expressão princípio da representação, como defende RIBEIRO LOPES no seu ensino oral. No entanto, uma vez que a expressão está enraizada e legalmente consagrada manteremos a sua utilização.
[17] A inscrição e consequente aquisição de condição de filiado – que constitui a representação laboral e cria um nexo funcional entre aderente e a respectiva entidade, gerando um amplo conjunto de efeitos, entre os quais se destaca a aplicação do regime convencional delimitado pelo princípio da filiação (artigo 496.º, n.05 1 e 2) – são questões essencialmente de direito (interno) associativo, mas é de salientar que tendo a filiação como pressuposto a qualidade de associado, isso significa que havendo uma inscrição inválida e ineficaz, tal situação não deixará de ter consequências ao nível da aplicação da convenção. Imagine-se, por exemplo, que um trabalhador se inscreve num sindicato que não representa efectivamente a sua actividade (profissão) ou não a representa na área (espacial) onde aquele a realiza (artigo 444.º, n.º I); ora, tal situação configura um dissenso entre a actividade exercida e a representada e, na segunda situação, entre o âmbito de intervenção geográfico do sindicato e o do trabalhador, o que naturalmente não poderá deixar de inviabilizar a aplicação da convenção, uma vez que a representação do outorgante não é legal e estatutariamente admitida, porquanto não existe a necessária conexão entre representante e representado. E, portanto, como cabe a quem invoca ser destinatário de uma convenção demonstrar os factos constitutivos do direito (artigo 342.º, n.º 1, do CC), o mesmo é dizer também os seus pressupostos que, neste caso, serão, desde logo, a validade e eficácia da inscrição.
Veja-se com interesse, DUARTE RODRIGUES, Âmbito de Aplicação da Convenção Colectiva de Trabalho, Instituto Superior de Contabilidade e Administração, Universidade de Aveiro, 1980, pp. 25-26, ainda que noutro quadro legal.
[18] Contrariamente ao que se verificava com a LAS [“conjunto de trabalhadores que exercem a mesma profissão, ou se integram na mesma actividade, ou que exercem profissões ou se integram em actividades de características globalmente afins entre si e diferenciadas de todas as demais”, artigo 2.0 , alíneag)], o CT2003 -e o de 2009 manteve a opção – não há qualquer definição de categoria, o que não quer dizer que não existam referências (por exemplo, artigo 444.º, n.º 1). E bem esteve o legislador ao eliminar aquela definição – que remontava ao regime em que existia unicidade sindical -, pois num quadro de liberdade e pluralismo sindical – bem diferente do que se verificava no Estado Novo, no qual a categoria profissional tinha um reconhecimento jurídico autónomo perante a organização sindical – não há uma realidade pré-jurídica ou ontológica que imponha ou condicione as opções de organização e representação dos trabalhadores; a decisão de identificar e destacar os interesses comuns e profissionais dos trabalhadores deve estar a cargo destes e, nessa medida, a definição legal não tinha justificação, pois não é ao Direito que compete criar, impor ou limitar a categoria profissional, mas sim aos trabalhadores [artigo 55.º, n.º 2, alinea a), da CRP]. Em suma, como escreveu o Tribunal Constitucional, aresto n.º 342/86, de 10 de Dezembro Diário da República, II série, número 65, de 19 de Março de 1987, p. 3486, a propósito da liberdade sindical, “é ao próprio sindicato que compete escolher o modelo da sua própria organização e, bem assim, definir a categoria profissional que há-de abarcar”; na mesma linha, inventariando diversas decisões em igual sentido, Ac. do Te. n.º 314/86, de 12 de Novembro, Diário da República, II série, n.º 61, de 14 de Março de 1987, p. 3287. Para mais desenvolvimentos, LIBERAL FERNANDES, A Obrigação de Serviços Mínimos como Técnica de Regulação da Greve nos Serviços Essenciais, Coimbra Editora, 2010, pp. 380 e ss, nota 841; LOBO XAVIER, Curso de Direito do Trabalho – Introdução, Quadros Organizacionais e Fontes, volume I, 3.ª edição, Verbo, Lisboa, 2004, pp. 173 esse 193 e ss, que conclui criticando a supressão da definição de categoria e o lugar destacado e explícito .da figura (p. 200); e mais recentemente, LOBO XAVIER, com a colaboração de FURTADO MARTINS, A. NUNES DE CARVALHO, JOANA VASCONCELOS, GUERRA DE ALMEIDA, Manual de Direito do Trabalho, cit., pp. 109-110 e 184 e ss. E sobre as correntes fundamentais relativas à natureza de categoria, DUARTE RODRIGUES, Concorrência de Convenções Colectivas de Trabalho, Separata de Estudos, ano I, 1981, A Lusitânia, Aveiro, 1982, pp. 5 e ss.
[19]. É certo que o legislador não prevê expressamente esta situação, mas devem as regras fixadas para o trabalhador e empregador individuais ser aplicáveis às situações associativas.
Retenha-se que o direito de inscrição (de trabalhadores e empregadores em associações e destas noutras) consta da Convenção n.º 87 da OIT (artigos 2.0 e 5.0).
[20] Salvo se estiver em causa a revisão de uma convenção que mantenha o âmbito da fonte revista.
Com interesse sobre o assunto, ainda que em quadro legal diferente, DUARTE RODRIGUES, Âmbito de Aplicação da Convenção Colectiva de Trabalho, cit., pp. 27 e ss.
[21] Ainda que não seja comum essa análise por parte da Administração.
[22] Sabemos que a convenção pode, atendendo ao critério geográfico de aplicação, ser objecto de uma ampla divisão, salientando-se o âmbito nacional, regional ou local, consoante o espaço que for abrangido pela fonte autónoma, consequência natural da amplitude de representação dos outorgantes. Estas classificações, ainda que com variações, são comuns na doutrina, cfr., por exemplo, MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 1989, reimpressão, 1994, p. 292; JORGE LEITE, Direito do Trabalho, volume I, cit., p. 163; ROMANO MARTINEZ, Direito do Trabalho, 6.ª edição, Instituto de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito de Lisboa, Almedina, Coimbra, 2013, p. 1055; PALMA RAMALHO, Direito do Trabalho, Parte I – Dogmática Geral, 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 2012, p. 254.
[23] Sobre a matéria, por exemplo, PEDRO MAIA, “Conflitos Internacionais de Convenções Colectivas de Trabalho”, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, volume LXVIII, 1992, pp. 181 e ss, em especial pp. 243 e ss; MOURA RAMOS, Da Lei Aplicável ao Contrato de Trabalho Internacional, Colecção Teses, Almedina, Coimbra, 1990, em especial pp. 33 e ss; MOURA VICENTE, “O Direito Internacional Privado no Código do Trabalho”, AA.VV., Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, IV Curso de Pós-Graduação em Direito do Trabalho e da Segurança Social, volume IV, coordenação de Romano Martinez, Almedina, Coimbra, 2003, pp. 15 e ss, em especial pp. 23 e 26-27; bem como, do mesmo Autor, “Destacamento Internacional de Trabalhadores”, Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Raul Ventura, volume II, Faculdade de Direito de Lisboa, 2003, pp. 789 e ss. E, na doutrina espanhola, por exemplo, RAMOS QUINTANA, “La Aplicación Territorial de las Normas Laborales: Diferentes Realidades y Nuevas Tendencias”, Revista de! Ministerio de Trabajo e Inmigración, 88, 2010, pp. 89 e ss, analisando especialmente a ordem jurídica comunitária. Veja-se também WOLFGANG DÃUBLER, Direito do Trabalho e Sociedade na Alemanha, LTr, São Paulo, 1997 (tradução de Arbeitsrecht und Gesellschaft in Deustschland, s.d., s.e., tradução de Alfred Keller), pp. 255-256.
[24] Como sabemos, o espaço geográfico de regulação do instrumento convencional releva em diversas matérias, tal como, e desde logo, na correlação retribuição/custo de vida, necessidades de transporte, apoios sociais (v.g., creches), elementos cuja intensidade pode variar ao longo do território nacional; por isso mesmo, o âmbito espacial é igualmente preponderante na formação da vontade das partes.
[25] Esta posição (inexistência de especiais problemas) é, por exemplo, sustentada por JOÃO CAUPERS e PEDRO MAGALHÃES, Relações Colectivas de Trabalho, Empresa Literária Fluminense, s.l., 1979, pp. 57-58. E também por LOBO XAVIER, Curso de Direito do Trabalho, 2.” edição, Verbo, Lisboa, 1993, p. 282, que escreve: “podem ocorrer também conflitos de competência no plano espacial relativamente às CCT, mas os factos não têm tido suficiente relevância dentro do nosso Ordenamento”.
[26] Tratando-se de um empregador, releva, em regra, o espaço em que este desenvolve a sua actividade.
[27] Estando em causa um acordo de empresa, não há obstáculo a que a sua aplicação fique circunscrita a um estabelecimento; veja-se, aliás, a noção de acordo de empresa fixada no artigo 2.0, n.º 3, alínea c). E, portanto, no caso de haver um acordo apenas aplicável a um estabelecimento [artigo 2. 0, n.º 3, alínea c)], o trabalhador para ser destinatário da convenção terá de realizar a actividade no estabelecimento em causa.
[28] Neste sentido, quanto ao âmbito territorial, no ordenamento francês (então artigos L. 132 5 e 132-11, actuais L. 2222-1 e 2222-2, e 2232-1 e 2232-5, respectivamente), MICHEL DESPA.X, Droit du Travai/ – Négociations, Conventions et Accords Col/ectifs, tome 7, dirigido por G. H. Camerlinck, deuxieme édition, Dalloz, Paris, 1989, p. 260. Contra este entendimento, referindo-se ao âmbito territorial e perante o artigo 85.0 , n.º 3, alínea b), do Estatuto de los Trabajadores – norma idêntica à do Código o Trabalho -, MOLERO MANGLANO, SÂNCHEZ-CERVERA VALDÉS, LÓPEZ ÁLVAREZ DIAZ-CANEJÁ, Manual de Derecho del Trabajo, “Tratados y Manuales”, Thomson Reuters, Civitas, Navarra, 2010, p. 934, afumando que as partes “… não podem fixar um âmbito nem superior nem inferior aquele em que têm competência para negociar”. Em nossa opinião as partes tanto podem fixar os âmbitos nacional, regional ou local como, dentro destes, proceder a delimitações específicas; as duas situações integram a autonomia colectiva, naturalmente com o limite do espaço de representação dos outorgantes.
[29] MAURICE E. AUBERT, Les Conjlits de Conventions Collectives de Travail, These de Licence et de Doctorat, Facolté de Droit- Université de Lausanne, Impremerie Henri Jaunin, Lausenne, 1957, p. 142, salienta a possibilidade de intervenção da autonomia colectiva, mas com a necessidade de respeitar os limites fixados pelo legislador no plano pessoal.
[30] Estamos a pensar, por exemplo, na noção de local de trabalho para efeitos de acidente de trabalho, não podendo da definição convencional resultar um esvaziamento ou diminuição da tutela legalmente conferida (artigo 12.º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro, Lei dos Acidentes de Trabalho, doravante LAT).
[31] Neste sentido, PEDRO MAIA, “Conflitos Internacionais de Convenções Colectivas de Trabalho”, cit., p. 208. Note-se que não está em causa apurar o conteúdo dos n.º’ 2 e 6 do artigo 194.º, mas sim sublinhar que os outorgantes da fonte convencional podem acordar um local de trabalho apenas para efeitos de aplicação da convenção colectiva. Sobre aquela matéria, por exemplo, MADEIRA DE BRITO, em ROMANO MARTINEZ, LUÍS MIGUEL MONTEIRO, JOANA VASCONCELOS, MADEIRA DE BRITO, GUILHERME DRAY e GONÇALVES DA SILVA, Código do Trabalho Anotado, cit., pp. 465 e ss.
[32] Sem prejuízo, reiteramos, dos limites já apontados.
[33] Neste sentido, por exemplo, MADEIRA DE BRITO, Do Local de Trabalho, Dissertação de Mestrado, Faculdade de Direito de Lisboa, policopiado, 1995, p. 59; e, do mesmo Autor, “Local de Trabalho”, AA.VV., Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, I Curso de Pós-Graduação em Direito do Trabalho, coordenação de Romano Martinez, Almedina, Coimbra, 2001, p. 356; MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito do Trabalho, cit., p. 685; MENEZES LEITÃO, Direito do Trabalho, 4.ª edição, Almedina, Coimbra, 2014, pp. 275-276; BARROS MOURA, A Convenção Colectiva entre as Fontes de Direito do Trabalho, cit., p. 226; PALMA RAMALHO, Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 5.ª edição, Almedina, Coimbra, 2014, p. 497.
[34] O local de trabalho assume relevância em muitas outras situações laborais, como é o caso, por exemplo: a noção de falta (artigo 248.º, n.º 1), pagamento da retribuição (artigo 277.º, n.º 1) e acidentes de trabalho (artigo 8.0 , n.º 1, da LAT). Recorde-se que o empregador tem o dever de informar o trabalhador do “local de trabalho ou, não havendo um fixo predominantemente, a indicação de que o trabalho é prestado em várias localizações” [artigo 106.º, n.º 3, alínea b)].
Para uma análise geral da matéria do local de trabalho, entre outros, LEAL AMADO, “Local de Trabalho, Estabilidade e Mobilidade: O Paradigma do Trabalhador on the Road”, AA.VV., O Direito do Trabalho nos Grandes Espaços – Entre a Codificação e a Flexibilidade, organização de Lobo Xavier, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2005, pp. 155 e ss; MENDES BAPTISTA, “Notas sobre a Mobilidade Geográfica dos Trabalhadores”, AA.VV., VII Congresso Nacional de Direito do Trabalho – Memórias, coordenação de António Moreira, Almedina, Coimbra, 2004, pp. 25 e ss; CATARINA CARVALHO, “A Mobilidade Geográfica dos Trabalhadores no Código do Trabalho”, AA.VV., VII Congresso Nacional de Direito do Trabalho – Memórias, coordenação de António Moreira, Almedina, Coimbra, 2004, pp. 43 e ss; MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito do Trabalho, cit., pp. 683 e ss; JÚLIO GOMES, Direito do Trabalho – Relações Individuais de Trabalho, volume I, Coimbra Editora, 2007, pp. 636 e ss; J. ANDRADE MESQUITA, Direito do Trabalho, 2.ª edição, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2004, pp. 569 e ss; LOBO XAVIER, “O Lugar da Prestação do Traba- lho”, Estudos Sociais e Corporativos, ano IX, n.º 33, 1970, pp. 11 e ss; e, em especial, MADEIRA DE BR1TO, Do Local de Trabalho, cit., passim. No quadro actual e tendo presente essencialmente a manualística, com amplas indicações doutrinárias, LEAL AMADO, Contrato de Trabalho, 4.ª edição, Coimbra Editora, 2014, pp. 245 e ss, bem como, “Modificação Substancial das Condições de Trabalho: O Caso da Mobilidade Geográfica (Ou a Submissão do Novo Direito do Trabalho ao «Imperialismo do Contrato»)”, Questões Laborais, ano XV, n.º 32, 2008, pp. 169 e ss; MONTEIRO FERNANDES, Direito do Trabalho, 17.ª edição, Almedina, Coimbra, 2014, pp. 387 e ss; MENEZES LEITÃO, Direito do Trabalho, cit., pp. 275 e ss; ROMANO MARTINEZ, Direito do Trabalho, cit., pp. 497 esse 698 e ss; PALMA RAMALHO, Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, cit., pp. 495 e ss, LOBO XAVIER, com a colaboração de FURTADO MARTINS, A. NUNES DE CARVALHO, JOANA VASCONCELOS, GUERRA DE ALMEIDA, Manual de Direito do Trabalho, Verbo, Lisboa, 2014, pp. 513 e ss. Veja-se também MENDES BAPTISTA, “A Mobilidade Geográfica no Código do Trabalho Revisto”, AA.VV., Código do Trabalho – A Revisão de 2009, coordenação de Morgado de Carvalho, Coimbra Editora, 2011, pp. 235 e ss; MADEIRA DE BRITO, em ROMANO MARTINEZ, Luís MIGUEL MONTEIRO, JOANA VASCONCELOS, MADEIRA DE BRITO, GUILHERME DRAY e GONÇALVES DA SILVA, Código do Trabalho Anotado, cit., pp. 461 e ss. E na doutrina italiana, por todos, PIERPAOLO CIPRESSI, ll Luogo della Prestazione di Lavara Subordinato, Guiffre, Milão, 1967, passim.
[35] Falamos em “elemento de conexão”, pois consideramos, como afirmámos, que, apesar de essa qualificação ser atribuída à filiação, em bom rigor uma análise desagregada desta, permite identificar outros elementos que estão implícitos ou são pressupostos.
[36] Também assim se tem pronunciado a jurisprudência espanhola, por exemplo, a Sentencia do Tribunal Superior de Justicia de Cataluña, n.º 3317/2009, de 23 de Abril, www.poderjudicial.es, p. 3, onde se afirma, invocando diversas decisões, que a convenção aplicável é a do lugar da prestação de serviços (lex loci executionis). Veja-se também MERCADER UGUINA, “La Silenciosa Decadencia del Principio de Norma Más Favorable”, Revista Española de Derecho del Trabajo, n.º 109, 2002, pp. 40 e ss, sublinhando que também se tem recorrido à aplicação da convenção mais favorável. Este “caminho” pressupõe, repita-se, que a autonomia colectiva não resolveu a questão, por exemplo, através de cláusulas que expressamente regulam as diversas situações atinentes ao local de trabalho ou autolimitam a sua aplicação espacial ou ainda que não resulta de forma expressa do seu conteúdo, pois é importante ter presente que podem existir cláusulas cujo âmbito aplicativo surge como natural e que regulam apenas situações exteriores ao denominado local de trabalho (por exemplo, um subsídio de viagem ao estrangeiro).
[37] O que em nossa opinião abrange tanto a actividade (propriamente dita) como o espaço geográfico em que esta se desenvolve, pois não sendo assim teríamos sujeitos filiados em entidades que representam uma área territorial onde aqueles não realizam qualquer actividade; por outro lado, atente-se no conteúdo do artigo 450.º, n.º 1, alínea a), que, sob pena de esvaziamento, impõe esta interpretação ao determinar que os estatutos das associações sindicais devem regular, entre outros elementos, o âmbito subjectivo (sector profissional), objectivo (sector de actividade económico) e geográfico (territorial). Parece ser também esta a posição de LOBO XAVIER, com a colaboração de FURTADO MARTINS, A. NUNES DE CARVALHO, JOANA VASCONCELOS, GUERRA DE ALMEIDA, Manual de Direito do Trabalho, cit., p. 125, e com interesse p. 189, referindo-se ao artigo 450.º, n.º 1, alínea a).
[38] Assim, BARROS MOURA, A Convenção Colectiva entre as Fontes de Direito do Trabalho, cit., pp. 226-227.
[39] Em sentido crítico sobre o lugar da celebração, ainda que noutra área jurídica, MOURA RAMOS, Da Lei Aplicável ao Contrato de Trabalho Internacional, cit., em especial pp. 519 e ss.
[40] A relevância do lugar de cumprimento da obrigação é há muito reconhecida, cfr. MADEIRA DE BRITO, Do Local de Trabalho, cit., pp. 7 e ss, bem como noutras áreas, por exemplo, MOURA RAMOS, Da Lei Aplicável ao Contrato de Trabalho Internacional, cit., pp. 526 e ss; VAZ SERRA, “Lugar da Prestação”, Boletim do Ministerio da Justiça, n.º 50, 1955, pp. 5 e ss, em especial 14 e ss.
[41] MADEIRA DE BRITO, “Local de Trabalho”, cit., p. 357.
[42] Sobre a noção de local de trabalho, LEAL AMADO, Contrato de Trabalho, cit., pp. 247-248; MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito do Trabalho, cit., p. 683, ensina que “o local de trabalho corresponde ao sítio onde o trabalhador deve concretizar a prestação a que se encontra adstrito”; MONTEIRO FERNANDES, Direito do Trabalho, cit.,  p. 388, escreve que “o local de trabalho é, em geral, o centro estável (ou permanente) de actividade de certo trabalhador e a sua determinação obedece essencialmente ao intuito de se dimensionarem no espaço as obrigações e os direitos e garantias que a lei lhes reconhece”, itálico no original; MENEZES LEITÃO, Direito do Trabalho, cit., p. 275, define-o como o “… sítio físico onde o trabalhador realiza habitualmente a sua actividade e onde se encontra, por isso, na disponibilidade do empregador”; PALMA RAMALHO, Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, cit., p. 500, ensina que o local de trabalho é “… centro estável ou predominante do desenvolvimento da actividade laboral (o que permite incluir tanto os casos do local de trabalho diluído com as deslocações do trabalhador ao serviço da empresa)” itálico no original.
[43] MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito do Trabalho, cit., pp. 684-685, que se refere ao local de trabalho efectivo ( espaço onde o trabalhador deve executar as suas tarefas), ao local de trabalho potencial (espaço geográfico onde o trabalhador pode ser obrigado a realizar a sua prestação, com base no poder de direcção), local de trabalho para efeitos disciplinares (área geográfica onde o comportamento do trabalhador pode ser relevante rem termos disciplinares), local de trabalho para efeitos de risco (espaço dentro do qual os acidentes são qualificados como de trabalho para efeitos de responsabilidade objectiva do empregador). Veja se também, por exemplo, JÚLIO GOMES, Direito do Trabalho – Relações Individuais de Trabalho, volume I, cit., pp. 636-637, que fala num conceito que se apresenta como teleológico; e PALMA RAMALHO, Direito do Trabalho, Parte li – Situações Laborais Individuais, cit., pp. 496-497. Na doutrina italiana, pode ver-se PIERPAOLO CIPRESSI, Il Luogo della Prestazione di Lavoro Subordinato, cit., pp. 16 e ss, salientando também a ausência de uma noção geral e unívoca de local de trabalho (p. 27).
[44] Em alguns casos, a noção de local de trabalho recebe resposta específica da lei. Para efeitos de acidentes de trabalho, local de trabalho “é todo o lugar em que o trabalhador se encontra ou deva dirigir-se em virtude do seu trabalho e em que esteja, directa ou indirectamente, sujeito ao controlo do empregador” [artigo 8.0 , n.º 1, alínea a), da LAT]. Idêntica é a noção no que respeita à promoção da segurança e saúde no trabalho, em que o local de trabalho é definido como “o lugar em que o trabalhador se encontra ou de onde ou para onde deva dirigir-se em virtude do seu trabalho, no qual esteja indirecta ou indirectamente sujeito ao controlo do empregador” [artigo 4.0, alínea e)], da Lei da Segurança e Saúde no Trabalho (Lei n.º 102/2009, de 10 de Setembro, com alterações). Em matéria de aspectos da organização do tempo de trabalho dos trabalhadores móveis em actividades de transporte rodoviário, a lei consagra uma definição precisa do local de trabalho: “… urna instalação da empresa, bem como outro local, nomeadamente o veículo utilizado, onde seja exercida qualquer tarefa ligada à realização do transporte” [artigo 2.0, alínea a), do Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de Junho].
[45] E não se ignore que há diversas situações em que a própria actividade do trabalhador influencia o local de trabalho, como bem sublinham, por exemplo, ROMANO MARTINEZ, Direito do Trabalho, cit., p. 498; e PALMA RAMALHO, Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, cit., pp. 499-500.
[46] Sentencia do Tribunal Superior de Justicia de Aragón, n.º 641/2010, de 27 de Septiembre, http://tsj.vlex.es/vid/-223719491, p. 6.
[47] No sentido da nulidade como consequência geral da ilegitimidade, vd., por exemplo, MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil, – Parte Geral, I, Tomo IV, Almedina, Coimbra, 2005, p. 24, para quem “a falta de legitimidade conduz à nulidade, quando esteja em causa a transmissão de bens”, considerando o artigo 892.º “tendencialmente aplicável aos diversos contratos onerosos, segundo o artigo 939.º do Código Civil; CARVALHO FERNANDES, Teoria Geral do Direito Civil, volume II, Universidade Católica Editora, Lisboa, 5.ª edição, 2010, p. 156, considerando como paradigma o regime da venda de coisa alheia como própria (artigo 892.º do Código Civil), “nomeadamente por o regime deste contrato se aplicar a outros contratos onerosos (art. 939.º do C. Civ.)”. Para uma análise das consequências relativas à nulidade das cláusulas convencionais, GONÇALVES DA SILVA, Da Eficácia da Convenção Colectiva, cit., volume II, em especial pp. 784 e ss.
[48] Também designado de aproveitamento do negócio jurídico inválido, CARVALHO FERNANDES, Teoria Geral do Direito Civil, volume II, cit., pp. 517-518. Sobre o tema, vd. também MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil, II, 4.”edição, Almedina, Coimbra, 2014, pp 947 e ss; CARVALHO FERNANDES, A Conversão dos Negócios Jurídicos Civis, Quid Iuris, Lisboa, 1993, pp. 515 e ss, JOSÉ ALBERTO VIEIRA, Negócio Jurídico – Anotação ao Regime do Código Civil (artigos 217. º a 295. j, Coimbra Editora, 2006, pp. 115 e ss.
[49] Na terminologia de PALMA RAMALHO, Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, cit., p. 499, itálico no original, ou seja, fora, portanto, do espaço físico da empresa; por exemplo, camionistas, inspectores, mecânicos itinerantes, etc.  A Autora, idem, separa este tipo de situações (“contratos de trabalho em que a natureza da actividade laboral não se compadece com a fixação de um local de trabalho único ou mesmo preponderante”) das dos “contratos de trabalho em que o local de trabalho se sujeita a alterações periódicas por força da actividade desenvolvida pela empresa (por exemplo, os trabalhadores de construção civil que desenvo vem a sua actividade sucessivamente nas diversas obras da empresa, em localidades diferentes”, itálicos no original. Neste caso, também nos parece que as partes podem definir um local de trabalho amplo, de modo a abranger as actuais e futuras situações, de modo a que não se justifique falar em alteração do local de trabalho. Já PEDRO MAIA, “Conflitos Internacionais de Convenções Colectivas de Trabalho”, cit., pp. 209 e ss, dando exemplos, como o motorista de automóveis, o piloto de avião, o comandante de avião, o carteiro e o paquete, afirma que o trabalho não é prestado num local determinado, defendendo que o local a ter em atenção é o espaço em que o trabalhador se deve apresentar para que o empregador exerça o poder de direcção; não sendo possível fixar o local nestes termos, então deve relevar o local da empresa, i.e., onde se encontra a unidade técnica laboral.
[50] Poderá haver também uma pulverização de locais de execução atendendo, por exemplo, à diversidade de funções dos diferentes trabalhadores, mas o círculo aplicativo será delimitado pelo espaço de representação dos outorgantes.
[51] Delimitação em que releva naturalmente o conjunto de funções· a que o trabalhador se vinculou. Sobre a determinação do local de trabalho, por exemplo; LEAL AMADO, Contrato de Trabalho, cit., p. 248; MADEIRA DE BRITO, Do Local de Trabalho, cit., pp. 70 e ss, bem como “Local de Trabalho”, cit., pp. 358 e ss; e, do mesmo Autor, em ROMANO MARTINEZ, LUÍS MIGUEL MONTEIRO, JOANA VASCONCELOS, MADEIRA DE BRITO, GUILHERME DRAY e GONÇALVES DA SILVA, Código do Trabalho Anotado, cit., pp. 462 e ss; JÚLIO GOMES, Direito do Trabalho – Relações Individuais de Trabalho, volume I, cit., pp. 637 e ss.; MENEZES LEITÃO, Direito do Trabalho, cit., p. 276; ROMANO MARTINEZ, Direito do Trabalho, cit., pp. 497 e ss.
[52] Como vimos, a convenção pode ter, por exemplo, uma circunscrição local, regional ou nacional. No caso de haver uma alteração administrativa à delimitação territorial utilizada pelas partes, o âmbito de aplicação da convenção deve ser mantido, quer estejamos perante uma diminuição ou ampliação da área geográfica administrativa, salvo se da vontade das partes resultar posição diversa. Em sentido próximo, MICHEL DESPAX, Droit du Travail – Négociations, Conventions et Accords Collectifs, cit., p. 26
[53] Defendendo MADEIRA DE BRITO, “Local de Trabalho”, cit., p. 363, que só há alteração do local do trabalho “… quando sejam excedidos os limites geográficos fixados para a realização da prestação do trabalho e agravadas as condições topográficas da realização da prestação do trabalho”, o que não significa para nós a existência de qualquer dano. De facto, não deixa de existir alteração do local de trabalho se o trabalhador passar a exercer a sua actividade em Leiria, em vez de Lisboa; apesar de residir naquele espaço. Por outro lado, tais alterações abrangerão tanto as situações transitórias como as definitivas (artigo 194.º).
[54] Estamos a falar dos elementos atrás referidos, a condição de filiado (pessoal), o âmbito territorial (geográfico), o sector de actividade e a profissão abrangido (funcional)  e o momento determinante de produção de efeitos da filiação (temporal).
[55] Note-se que o fim da aplicação de uma fonte convencional poderá gerar a aplicação de uma nova fonte (aplicação sucessiva), desde que naturalmente estejam verificados os seus pressupostos; é o caso, por exemplo, de um acordo colectivo para o sul, passando agora o trabalhador a executar a sua actividade no norte, espaço para o qual também o seu sindicato celebrou uma outra convenção com o mesmo empregador.
[56] ISABELLE DESBARATS, L ‘Entreprise à Établissements Multiples en Droit du Travail, cit., p. 39, distingue entre transferência definitiva para outro estabelecimento do mesmo empregador de uma alteração temporária, defendendo, na primeira hipótese, que o trabalhador, salvo indicação em contrário, não poderá reivindicar a aplicação da convenção, pois não pertence ao conjunto de trabalhadores do seu anterior estabelecimento; na segunda situação, ele continuará a beneficiar da convenção aplicável.
[57] Se, por exemplo, estiver em causa um acordo de empresa, subsumindo se ainda o novo local no espaço de representação da associação sindical, a convenção colectiva mantém o seu elemento de conexão e, deste modo, a sua aplicação, não sendo afectado o poder normativo dos outorgantes.
[58] Por exemplo, o trabalhador vai participar na reunião anual de quadros da empresa no Porto, realizando habitualmente a sua prestação em Lisboa; ou vai participar numa acção de formação da empresa nos mesmos termos. Para uma destrinça entre deslocações ao serviço e transferências temporárias (alteração do local de trabalho), em regime diverso do actual Código do Trabalho, MADEIRA DE BRITO, “Local de Trabalho”, cit., pp. 363 e ss, para quem existe” … uma transferência temporária nos casos em que o trabalhador seja integrado numa outra organização, fora do âmbito geográfico da sua prestação e aí execute as funções correspondentes a um posto de trabalho … ” e “pelo contrário, se o trabalhador realiza a sua prestação fora do seu âmbito normal, mas isso não corresponde a um novo local de trabalho então estaremos no âmbito das deslocações” (p. 363); e, do mesmo Autor, Do Local de Trabalho, cit., pp. 122 e ss. J. ANDRADE MESQUITA, Direito do Trabalho, cit., 2004, pp. 576-577, refere-se às deslocações em serviço e alterações do local de trabalho, concluindo: “A deslocação em serviço caracteriza-se, portanto, pela manutenção do centro laboral, enquanto sítio onde o trabalhador pode receber a correspondência profissional, ter um telefone fixo, gabinete de trabalho e preparar e executar as tarefas, incluindo as que vai desempenhar durante a deslocação” (p. 576); e no quadro actual, LOBO XAVIER, com a colaboração de FURTADO MARTINS, A. NUNES DE CARVALHO, JOANA VASCONCELOS, GUERRA DE ALMEIDA, Manual de Direito do Trabalho, cit., pp. 529 e ss, distingue curtas deslocações e transferências temporárias, afirmando, a propósito do artigo 193.º, n.º 2, que estarão em causa “.. . deslocações de curta duração, que não afectam seriamente a estabilidade do trabalhador”. [59] Assim, MADEIRA DE BRITO, “Local de Trabalho”, cit., p. 364.
[60] Ensina ROMANO MARTINEZ, Direito do Trabalho, cit., p. 698, que as meras deslocações ao serviço da empresa não acarretam alteração do local de trabalho. Como bem  escreve MADEIRA DE BRITO em ROMANO MARTINEZ, LUÍS MIGUEL MONTEIRO, JOANA VASCONCELOS, MADEIRA DE BRITO, GUILHERME DRAY e GONÇALVES DA SILVA, Código do Trabalho Anotado, cit., p. 464, “o exercício de funções assim definido geograficamente é ainda objecto contratual”. Na mesma linha, JÚLIO GOMES, Direito do Trabalho – Relações Individuais de Trabalho, volume I, cit., p. 640, que fala numa expansão do local de trabalho, não estando em causa a modificação do local, mas a exigência que o trabalhador se desloque ou se apresente noutro ponto que cabe ainda dentro do seu local de trabalho; CATARINA CARVALHO, ”A Mobilidade Geográfica dos Trabalhadores no Código do Trabalho”, cit., p. 45, que também sublinha que nestas situações não está em causa uma verdadeira mobilidade geográfica e, por outro lado, que o vocábulo deslocação é utilizado pelo Código para designar este género ge alterações que “encontram cobertura no próprio contrato por inerência com o desempenho das funções acordadas, ou por força deste alargamento legal do âmbito geográfico contratualmente definido”.
[61] Neste sentido, embora com pressuposto diferente, PEDRO MAIA, “Conflitos Internacionais de Convenções Colectivas de Trabalho”, cit., p. 208.
[62] O Tribunal do Funchal, em decisão de 12 de Junho de 1985, processo n.º 34/84, não publicado, defendeu que estando um trabalhador do continente temporariamente deslocado na Ilha da Madeira, se deveria continuar a aplicar o Contrato Colectivo de Trabalho Vertical para a Indústria de Construção Civil e Obras Públicas do Sul, afirmando: “a lei não prevê a existência de conflitos de instrumentos de regulamentação colectiva no espaço, pelo que tem de ser sempre aplicável ao mesmo trabalhador, independentemente da área territorial onde vá exercer sucessivamente a profissão, o mesmo instrumento de regulamentação colectiva”. Deve, no entanto, destacar-se, e apesar da diminuta fundamentação, que as partes no contrato de trabalho tinham estabelecido a aplicação desta fonte convencional e, por outro lado, a possibilidade de o trabalhador realizar a sua actividade noutras obras do empregador, independentemente da sua localização.
[63] Parece ser também a posição de BARROS MOURA, A Convenção Colectiva entre as Fontes de Direito do Trabalho, cit., p. 227, que, sem distinguir as situações, afirma: “se o trabalhador se encontra temporariamente deslocado do local onde estavelmente presta trabalho, a convenção, não deixa, por isso, de se lhe aplicar”.
[64] A jurisprudência espanhola – Sentencia do Tribunal Superior de Justicia de Extremadura, n.º 815/2007, de 20 de Diciembre de 2007, cit., p. 6 -tem considerado que no caso de alteração temporária, a convenção aplicável deve continuar a ser a do lugar de outorga do contrato, coincidente com o da prestação inicial dos serviços.

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