O Regulamento (UE) n.º 258/2012 que aplica o artigo 10.º do Protocolo das Nações Unidas contra o fabrico e o tráfico ilícitos de armas de fogo, das suas partes e componentes e de munições, adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Protocolo das Nações Unidas sobre as armas de fogo), e estabelece autorizações de exportação e medidas de importação e de trânsito de armas de fogo, suas partes, componentes e munições deverá ser objeto de uma proposta de revisão a apresentar pela Comissão Europeia na penúltima semana de setembro.
Em dezembro de 2017, a Comissão publicou uma avaliação da aplicação do Regulamento na qual identificou lacunas decorrentes da falta da sua aplicação homogénea. No seu seguimento, em abril de 2018, foi emitida uma recomendação que apelava ao reforço das regras da União Europeia para melhorar a rastreabilidade e a segurança dos procedimentos das exportações e importações de armas de fogo, bem como a cooperação entre as autoridades na luta contra o tráfico destas armas.
A avaliação do Regulamento concluiu que este era demasiado vago (criando uma carga administrativa e abordagens nacionais inconsistentes) e que contém lacunas jurídicas. Mais especificamente, identificou as seguintes questões:
- (i) Problemas de âmbito e definições – o Regulamento (tipo de armas e pessoas em causa) ainda não está alinhado com a Diretiva 2021/555 relativa ao controlo da aquisição e da detenção de armas, entretanto revista, redundando na inexistência de regras comuns da UE sobre importação, exportação e trânsito de algumas armas;
- (ii) Aplicação heterogénea de procedimentos – devido ao carácter vago das disposições do regulamento, os Estados-Membros têm disposições e abordagens divergentes em muitos aspetos, tais como procedimentos de importação, coordenação entre as autoridades aduaneiras e de licenciamento, se uma arma de fogo é ou não considerada de grau militar, que tipo de procedimentos simplificados devem ser aplicados (nomeadamente para importações e exportações temporárias), utilização de documentos eletrónicos, entre outras. As partes interessadas consultadas salientaram que são necessárias regras expressas e pormenorizadas para o intercâmbio de informação entre autoridades competentes para fins de inteligência e análise de risco, e para garantir uma interpretação uniforme das regras de importação e exportação no território aduaneiro da União. Os princípios gerais estabelecidas pelo Regulamento são consideradas insuficientes a esse respeito;
- (iii) Riscos de contrabando e de desvio – as marcas de importação muitas vezes não cumprem os requisitos do Protocolo da ONU e as autoridades policiais e aduaneiras continuam a ter uma abordagem divergente em relação à importação de armas de alarme e de sinalização convertíveis, bem como de componentes essenciais semi-acabados não marcados, para os quais o contrabando constitui um risco elevado, e que o Regulamento não aborda.
- (iv) Dificuldades no rastreio – o rastreio das armas de fogo apreendidas é tornado complexo pela fragmentação de diferentes bases de dados.
- (v) Controlos descoordenados e avaliação de risco – as disposições relacionadas com o intercâmbio de informações entre as autoridades nacionais competentes não cumpriram os resultados esperados: as autorizações de exportação são concedidas embora transações semelhantes (mesma arma, mesma destino) sejam proibidos noutros Estados-membros. Além disso, nem todas as recusas (ou os seus fundamentos) são acessíveis às autoridades competentes de outros Estados-membros. 43% das autoridades nacionais competentes auscultadas mencionaram ter concedido uma autorização de exportação nos casos em que transações semelhantes tenham sido recusadas por outros Estados-membros.
- (vi) Obstáculos ao comércio – Globalmente, o Regulamento não harmonizou suficientemente as regras e procedimentos nacionais para proporcionar aos comerciantes um valor acrescentado: as empresas não sentiram os benefícios económicos da legislação da UE ou uma redução dos encargos administrativos porque se viram confrontadas com uma contínua heterogeneidade regulamentar a nível nacional.
Em suma, o panorama no tocante às informações continua a ser fragmentado devido à ausência de dados abrangentes e comparáveis sobre as apreensões de armas de fogo no continente. O intercâmbio de informações para fins de investigação criminal e definição de perfis é limitado por restrições decorrentes do direito nacional que rege a partilha de informações (incluindo dados não pessoais, como dados balísticos) fora de uma investigação específica. A falta de comunicação e coordenação entre as várias administrações, seja a nível nacional ou transnacional, vem agravando este problema.
Os pontos focais para as armas de fogo existentes na maioria dos Estados-Membros não dispõem das competências (para controlo administrativo, recolha de dados para fins de aplicação da lei, acesso a bases de dados, rastreio, cooperação internacional e investigação forense) nem do pessoal adequados, conforme recomendam as orientações sobre as melhores práticas, elaboradas pelos peritos nacionais em matéria de armas de fogo.
Acresce que a criminalização do tráfico de armas assume forma desigual: nem todas as transferências de armas transfronteiriças não autorizadas são consideradas tráfico, o que contraria o Protocolo das Nações Unidas sobre as Armas de Fogo. Esta situação resulta, por vezes, na não aplicação da lei e de sanções e também limita o confisco dos produtos do crime gerados pelo tráfico de armas de fogo. As diferentes abordagens nacionais impedem operações transfronteiriças conjuntas, como as entregas controladas.
A iniciativa da Comissão deverá manter o compromisso europeu com o combate ao tráfico de armas de fogo, passando por assegurar uma implementação uniforme do Protocolo da ONU, procurar melhorar a rastreabilidade das armas de fogo nas transações internacionais (importação, exportação e trânsito), aperfeiçoar a troca de informações entre as autoridades nacionais, a fim de evitar a evasão às proibições de exportação, aumentar a segurança dos procedimentos de controlo das exportações e importações de armas de fogo (maior clareza em procedimentos simplificados).
Estas medidas deverão, em simultâneo, facilitar o comércio internacional legítimo de armas de fogo e apoiar a indústria europeia ao proporcionarem um ambiente legislativo sólido com a menor carga burocrática possível.
Esta iniciativa, constante do Plano de Ação da UE sobre o Tráfico de Armas de Fogo para 2020-2025 e do Programa de Trabalho da Comissão, esteve inicialmente prevista para o primeiro trimestre de 2022.
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